A primeira vacina do mundo contra esquistossomose (ou barriga d'água), brasileira, foi apresentada nesta terça-feira (12) pela Fiocruz, a Fundação Oswaldo Cruz, que a desenvolveu e patenteou.
Mais precisamente, a vacina foi aprovada nos "testes clínicos de fase 1" — ou seja, mostrou ser segura e capaz de imunizar contra a doença.
Baseada no antígeno Sm14, ela é a primeira vacina contra vermes parasitários, ou helmintos. Seu potencial "multivalente" a faz ser também eficaz contra fasciolose, a verminose que afeta o gado, e também se tornar uma possível base para imunizantes de outras doenças causadas por helmintos.
São mais de 30 anos de empenho na vacina, que foi produzida a partir de um antígeno (substância que estimula a produção de anticorpos). Confira, abaixo, as informações sobre a doença e a cronologia do desenvolvimento da vacina:
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O que é? | ||||
Conhecida popularmente como barriga d'água, a esquistossomose pode evoluir como doença pouco sintomática numa fase inicial, podendo evoluir para formas clínicas mais graves e óbito. Estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que mais de 800 milhões de pessoas vivam em áreas endêmicas, em mais de 70 países, tornando-se a segunda doença parasitária mais devastadora socioeconomicamente, atrás apenas da malária. Está presente em 18 Estados brasileiros, com maior incidência na região Nordeste e no Estado de Minas Gerais. Doença crônica causada por parasitos do gênero Schistosoma, a esquistossomose tem maior prevalência em locais de baixa infraestrutura sanitária. Caramujos do gênero Biomphalaria atuam como hospedeiros intermediários, enquanto o homem é seu hospedeiro definitivo. | ||||
Transmissão | ||||
Locais de água doce com pouca correnteza ou água parada e presença de caramujos infectados são ambientes propícios para a transmissão da esquistossomose. O contágio é feito quando a larva penetra na pele do indivíduo que, após infectado, libera ovos do parasita em suas fezes — que podem ser depositados em ambientes de água doce. Em contato com a água, os ovos eclodem dando origem a novas larvas que se alojam em caramujos, desenvolvem-se em cercárias, são liberadas na água e voltam ao ciclo, podendo infectar outro hospedeiro definitivo. | ||||
Sintomas | ||||
A doença pode se manifestar em duas fases: aguda e crônica. Na aguda, a mais comum, o indivíduo pode apresentar manifestações clínicas como coceiras e dermatites, fraqueza, febre, dor de cabeça, diarreia, enjoos e vômitos. Na crônica, geralmente assintomática, o agravo pode evoluir para um quadro mais grave com aumento por fibrose do fígado, aumento do baço, podendo, também, causar hemorragias provocadas por rompimento de veias do esôfago e barriga d'água (dilatação do abdome). As formas graves são as menos frequentes. A grande importância médica e social da endemia é sua magnitude, o número gigantesco de pessoas infectadas e expostas a risco. De acordo com nova reavaliação e classificação das doenças pela OMS, com base no impacto das doenças, seus sintomas, duração e sequelas, na qualidade de vida das pessoas, a esquistossomose passou para o topo do ranking de importância e impacto das doenças, por conta da espoliação crônica que acarreta, com anemia e comprometimento da capacidade cognitiva das crianças, com efeito direto na capacidade de aprendizado escolar e força de trabalho dos adultos jovens, das populações mais afetadas, que vivem nas áreas endêmicas dos países que dependem da saúde e bem-estar destas populações para atingir seu pleno desenvolvimento. | ||||
Tratamento, controle e prevenção | ||||
A doença vem sendo tratada com medicamentos antiparasitários. Evitar a proliferação de caramujos, melhorar o saneamento básico e educação em saúde são ações complementares das tentativas de controle. A prevenção, até o momento, não é alcançadas pelas medidas acima . A produção e utilização em ampla escala de uma vacina permitirá a interrupção da transmissão da endemia e poderá transformar completamente este cenário. | ||||
Cronologia da vacina | ||||
1975 |
Descoberta da molécula Sm14 e fase experimental no Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) Início do Estudo de Antígenos Protetores do Schistosoma mansoni Descoberta de componentes derivados de vermes vivos Criação do Laboratório de Esquistossomose Experimental do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) |
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1980 | Evidências experimentais de antígenos protetores contra a infecção pelo Schistosoma mansoni — definição do Extrato Salino (SE) | |||
1985 | Desenho de modelos experimentais definidos para o desenvolvimento da vacina contra a esquistossomose | |||
1990 |
Fase Experimental Molecular Clonagem da Proteína Sm14 da família das FABPs, que ligam lipídeos Desenvolvimento do modelo tridimensional da proteína, início da colaboração com Drs. Andrew Simpson e Richard Garratt |
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1995 |
Caracterização da proteção com Sm14 contra infecção por Schistosoma e Fasciola em animais de laboratório Depósito da primeira patente (dezembro de 1993) |
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2000 |
Demonstração da proteção induzida por Sm14, no gado ovino (Prova de Conceito) Depósito de nova família de patentes para formas mutantes mais estáveis Escalonamento da molécula em parceria com o Instituto Butantan |
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2005 |
Licenciamento do Sm14 (patentes para as vacinas de uso Humano e Veterinário) para Alvos Consultoria mediante parceria público-privada Desenvolvimento e Comercialização de Produtos Biotecnológicos S/A |
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2010 |
Reunião na Organização Mundial da Saúde, em Genebra – 'The Sm14 schistosomiasis vaccine candidate: status and plans for clinical trials' Desenvolvimento industrial da vacina veterinária para fasciolose Depósito de nova patente Compra da Alvos pela OuroFino Saúde Animal |
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2011 |
Importação dos Lotes Sm14 e GLA / GMP dos Estados Unidos (LIC/Florida Biologics e IDRI) Início do Teste Clínico Humano Fase 1 — colaboração científica com o IPEC/Fiocruz Testes de segurança em gado bovino — Ourofino (SP) Elaboração de banco de dados Relatórios específicos e documentos regulatórios Acordo com o Infectious Disease Research Institute (EUA) para formulação e fornecimento do adjuvante do grupo GLA para vacinas humana e veterinária |
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2012 |
Finalização do Teste Clínico Humano Fase 1 Formulação da vacina veterinária e registro de Piloto no MAPA |
FONTE: Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz)