“A impunidade é o que mais influencia na reincidência criminal”

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O grande número dos assaltos a bancos no estilo conhecido como “Novo Cangaço”, em que quadrilhas invadem agências do interior e usam populares como "escudos humanos", colocou Mato Grosso, mais uma vez, em destaque na imprensa nacional. 

Além disso, o aumento da criminalidade no Estado – já foram mais de 300 assassinatos somente neste ano – fez soar o alarme na área de segurança pública.

Segundo o chefe de Estado Maior da Polícia Militar, coronel Joelson Sampaio, admitiu que a Polícia Militar do Estado tem deficiências – e que faltam investimentos. “Sabemos que o homem sozinho faz um trabalho bom. Um homem motivado, e com equipamentos adequados faz um trabalho melhor ainda, produz muito mais”, avaliou. 

Segundo ele, o alto índice de criminalidade é reflexo do tráfico de drogas e da sensação de impunidade dos infratores, que usam e abusam das lacunas na legislação penal para se manterem fora das prisões. 

O oficial também afirmou que Mato Grosso tem projetos para investimento na área, entre eles a realização de um novo concurso que pretende formar mais 1,2 mil policiais. 

Veja os principais trechos da entrevista: 

MidiaNews – As ações de bandidos no interior do Estado demonstram que as cidades menores e afastadas da região metropolitana estão mais suscetíveis ao ataque de bandidos. Como o Estado pretende resolver esse problema? 

Cel. Sampaio – 
Em relação aos eventos ‘Novo Cangaço’, existe um sistema de inteligência, que envolve os órgãos do Sistema de Segurança Pública e também outros setores, a chamada ‘Comunidade de Inteligência’. Essa comunidade mapeia todas essas ações e muitas têm sido evitadas. Vocês [imprensa] conseguem mostrar as ações que ocorreram, mas as que foram evitadas não ficam sabendo. Essas ações, quando são detectadas, nós intensificamos o policiamento, fazemos a chamada saturação nos municípios que aconteceriam os assaltos. A saturação é enviar policiais da Força Tática, que ficam nas cidades e assim os bandidos percebem a movimentação e abortam os assaltos.

"As nossas respostas nos últimos acontecimentos são positivas. Em um dos casos de confronto que teve com o Bope, cinco bandidos saíram mortos, levaram a pior"

MidiaNews – Existem, então, outras instituições no combate ao “Novo Cangaço”. 

Cel. Sampaio
 – A PM não trabalha sozinha. Existe todo um sistema que envolve a Polícia Militar, [Polícia] Civil, Politec [Perícia Oficial do Estado], Polícia Federal, Gaeco [Grupo de Combate ao Crime Organizado], estamos sempre trocando informações sobre tudo que está acontecendo. As nossas respostas nos últimos acontecimentos são  positivas. Em um dos casos de confronto que teve com o Bope, cinco bandidos, que assaltaram uma agência em Campos de Júlio, saíram mortos, levaram a pior. As nossas respostas positivas são bem maiores do que as que não conseguimos dar resposta. Se a gente não consegue evitar, compensamos de outras formas.

MidiaNews – A Polícia Militar possui efetivo suficiente para combater o alto índice de criminalidade, dificultado pela grande extensão territorial de Mato Grosso? Qual é esse número? 

Cel. Sampaio
 – O efetivo gira em torno de 6,9 mil militares. É variável porque temos alguns policiais afastados e também os com pedidos de aposentadorias. Na verdade essa carência de efetivo é superada pela vontade do policiais. O policial se desdobra para suprir essa carência que existe. A vontade do nosso policial em produzir resultado e trabalhar em prol da comunidade, acaba superando isso. O Estado tem buscado suprir essa deficiência, fazendo concursos regionalizados. As vagas são abertas, mas para locais onde existe a carência de policial. Estamos indo para o terceiro concurso nessa metodologia. A pessoa presta concurso para uma região do interior e lá ele deve ficar por pelo menos cinco anos. Devemos lançar um edital ainda esse ano para um novo concurso, serão pelo menos 1,2 mil vagas. 

MidiaNews – Os policiais militares ganham um bom salário? Está no mesmo nível de outras polícias do país?



Cel. Sampaio

 

Cel. Sampaio – Mato Grosso está entre os estados que melhor paga as polícias. O salário inicial para um policial militar é de R$ 1,6 mil. Esse não é um salário que possa dizer que é ruim de tudo. Isso depende muito do tipo de vida que a pessoa leva, as suas despesas, o que sustenta, se é casado, quantos filhos têm. Essa análise você pode fazer em qualquer profissão, não somente com o policial

 

MidiaNews –  Os policiais estão equipados adequadamente para enfrentar bandidos que portam até fuzis e dinamites? As viaturas disponibilizadas pelo Estado não estão defasadas diante do uso constante de caminhonetes com alta potência nos assaltos? 

Cel. Sampaio
 – Nós temos um estado gigantesco, e existem lugares que em época de chuva ficam intransitáveis. Quando não é lama, é poeira. Esses municípios com maiores dificuldades, a PM busca destinar viaturas maiores, altas, como as caminhonetes. Temos os exemplos dos comando de Juína, Vila Rica e outros que possuem estradas sem pavimentação. Sabemos que não atende a 100%, mas nem por isso o policial vai deixar de produzir. Tem que produzir com o que tem.

MidiaNews – Essa situação não expõe uma falha do Estado, que não equipa adequadamente seus policiais. A motivação é suficiente no confronto direto com o bandido? 

Cel. Sampaio – 
Os policiais sabem de sua função e trabalham com o que tem. Um exemplo disso é o caso do assalto há mais de 20 dias, a uma agência bancária em Marcelândia, situada na região Norte do Estado. Até hoje temos policiais lá, e que não irão sair do local. Mesmo que falte uma viatura isso não vai fazer com que os policiais deixem a missão. Todos estão comprometidos e só saem da lá quando pegarem os caras. 

MidiaNews – Mesmo com a dedicação dos policiais, existem planos de investimento para melhorar as condições de trabalho da categoria? 

Cel. Sampaio
 – Existe sim um planejamento do Estado, principalmente com o advento da Copa do Mundo. Existem projetos para aquisição de equipamentos, armas… Mas o Estado faz aquilo que pode fazer, dentro das possibilidades. Nós recebemos um lote de 50 fuzis 762 e 556, que foi distribuído para todas as Forças Táticas do Estado. Nós praticamente dobramos a nossa quantidade de fuzis no interior.

"Se tiver uma ocorrência e precisarem do Bope fora de Cuiabá, no máximo em três horas eles chegam"

MidiaNews – Batalhões como o Bope, Rotam [Ronda Ostensiva Tática Móvel] e Força Tática, são fundamentais para manter a ordem e segurança. Mas, mesmo assim, o número de policiais nesses grupos ainda é insuficiente. Existe um plano para aumentar essas tropas? 

Cel. Sampaio – 
A Rotam é uma tropa de policiamento tático móvel, ela tem atuação em todo o Estado, mas se concentra em Cuiabá e Várzea Grande. Cada Comando Regional possui a sua Rotam, é a Força Tática. Eles atuam em época de pagamentos de salários, e em vários casos que necessitam de uma presença mais efetiva de policiamento. O Bope é um batalhão que atua em situações que envolve um maior risco. Ele vai agir em sequestros, ou em casos como esse dos assaltos em Marcelândia e Comodoro. É uma tropa que possui preparos específicos, com habilidades especiais para fazer buscas no mato. Essa tropa, mesmo sendo sediada em Cuiabá, opera em todo o Estado. Se tiver uma ocorrência e precisarem do Bope fora de Cuiabá, no máximo em três horas eles chegam. Temos os aviões do Estado para isso, e quando os aviões não estão disponíveis, existe o serviço de locação para atender as necessidades. Não é possível ter um Bope no interior, nenhum estado tem. Bope é na Capital, mas dando suporte em toda a nossa extensão territorial. 

MidiaNews – Em relação a novos equipamentos para a Polícia Militar, existe algum projeto em vista?  

Cel. Sampaio – 
Temos um projeto para adquirir uma nova aeronave. O Governo está empenhado. É uma aeronave que carrega 12 policiais por viagem. Em uma situação de risco,12 policiais do Bope fazem uma diferença muito grande. Ela também voa em uma velocidade maior. Então, com esse avião, em qualquer situação que eclodir um problema o Estado estará em condições de atuar. 

MidiaNews – As falhas do sistema prisional, com as constantes fugas – como a explosão do muro da Penitenciária Central há pouco mais de dois meses – não têm atrapalhado a polícia, que precisa recapturar os presos? 

Cel.Sampaio – Os problemas no sistema prisional são preocupantes. Eles de fato existem, é uma realidade em todo o país. Mas, além disso, o grande problema mesmo está em se manter o preso, preso. E isso é por conta de nosso sistema legal, as nossas leis. O nosso código de processo penal está desatualizado e dá espaço para manobras, das mais variadas, que permitem que o marginal não fique preso. Esse é o maior problema. O sistema prisional, mesmo com as dificuldades, tem resistido bem. Mas o maior problema que enfrentamos é um código [penal], que permite que um marginal com três homicídios fique solto. Esses dias prendemos um homem e ele já respondia por cinco homicídios e estava solto. Isso só acontece aqui, que sistema penal que é esse? Se contarmos isso em qualquer lugar do mundo ninguém acredita. 

MidiaNews – A região metropolitana já chegou à marca dos 300 assassinatos em 2012. Com essa média, é provável que nesse ano se chegue ao índice de um assassinato por dia. Com essa estatística, Mato Grosso pode ser considerado um dos estados mais violentos do país? 

Cel. Sampaio – A violência é um tema muito difícil de falar, existem vários fatores que potencializam essa situação. É preciso fazer um estudo muito detalhado sobre esses casos. Mas, Mato Grosso possui um grande problema, que é a região de fronteira com a Bolívia, que favorece o acontecimento do tráfico de drogas. A droga gera vários tipos de conflitos, a disputa de território, as dívidas com traficantes, onde alguém sempre acaba sendo morto. A polícia está trabalhando firmemente nesses casos. O número de prisões aumentou muito, a quantidade de bocas-de-fumo estouradas pela PM também cresceu. Também contamos com as ações das polícias Civil e Federal. 

MidiaNews – O senhor acredita que a sensação de impunidade é uma das grandes motivadoras da violência? 

Cel. Sampaio – 
Eu penso que a sensação de impunidade é aquilo que mais influencia na reincidência criminal. Temos registros de pessoas que já foram presas uma, duas, três, quatro vezes pela polícia e elas não ficam presas. A polícia não consegue alcançar essa pessoa. Se a pessoa rouba e fica presa, ela vai pensar duas vezes antes de roubar novamente. Agora, se rouba e não acontece nada, vai roubar de novo. Então esse é um fator para ser explorado. Além da droga, que é uma indutora, porque a pessoa começa como uma viciada e, se ninguém botar a mão nela para tratar e oferecer condições de recuperação, essa pessoa passa a ser uma delinquente, que rouba e furta para sustentar o vicio. E a pessoa vai cometer crimes mais graves para manter o vício. 

"Se a pessoa rouba e fica presa, ela vai pensar duas vezes antes de roubar novamente. Agora se rouba e não acontece nada, vai roubar de novo"



MidiaNews – Como está a situação do policiamento de fronteira, que chega aos 700 km? Meses atrás, tivemos o caso de dois brasileiros que foram queimados vivos na Bolívia, evidenciando que a situação é critica. Qual a atuação da PM naquela região? 

Cel. Sampaio – 
A Polícia Militar e a Secretaria de Governo tem o projeto que é referencia para o Estado e para a nação, que é o Gefron [Grupo Especial de Fronteira]. Ele consegue, com todas as limitações que possui, dar uma resposta à sociedade. Tanto que agora os traficantes não conseguem mais mandar droga por terra e estão mandando pelo ar, usando aviões. Isso gerou a visita do ministro da Defesa, testando um equipamento novo, que é uma aeronave não tripulada, que possui um sistema de vigilância, que consegue ver tudo que se passa. Esse equipamento está em teste e é uma parceria com o Governo Federal. Queremos lançar esse tipo de tecnologia para fazer o serviço de vigilância. 

MidiaNews: Falta ajuda do Governo Federal para proteger a fronteira? 

Cel. Sampaio – 
Não há dúvida que a região de fronteira precisa de atenção e é um ponto ainda frágil. Tanto que o Governo Federal lançou um programa, o Enafron [Estratégia Nacional de Fronteira], voltado em investimento e tecnologia para a fronteira. Através desse projeto, foram adquiridos muitos equipamentos e viaturas apropriadas para andar naquela localidade. Nesta semana tivemos uma audiência pública em Cáceres para tratar desse problema da região de fronteira. Temos a previsão de adquirir um equipamento que faz raio-x dos veículos, e assim consegue identificar tudo que o veículo tem sem precisar fazer aquela revista minuciosa. Também iremos implantar um canil em Cáceres e usar os cães farejadores para ajudarem na localização de drogas. 

MidiaNews – Tem sido cada vez maior o número de policiais envolvidos em situações que podem evidenciar um despreparo para a função. Temos casos de PMs que se envolveram em brigas, ou que chegaram a matar pessoas por motivos banais. Como a instituição enxerga ocorrências deste nível? 

Cel. Sampaio – O curso de formação da PM de Mato Grosso segue uma orientação nacional. Existe o que a gente chama de currículo nacional de formação de policiais, e é muito interessante. Não existe um despreparo. Em uma turma de mil policiais, você tem um ou outro que apresenta problema. Esse policial não está mantendo aquilo que ele aprendeu em sua formação. Talvez esse policial, por alguma razão, não tenha assimilado aquilo que foi ensinado para ele. Isso não é despreparo. Se fosse despreparo, seriam 6,9 mil policiais com problemas. É provável que eles já tinham um comportamento avesso e vieram para polícia, e acabou que isso não foi detectado. 

MidiaNews – Praticamente todos os estados, neste ano de 2012, apresentaram altos índices de assassinatos contra policiais. Como Mato Grosso está nesse ranking? 

Cel. Sampaio
 – É uma situação preocupante, mas Mato Grosso não está entre os maiores. Saiu uma matéria no jornal A Gazeta, que teve como base uma reportagem da Folha de São Paulo, que coloca Mato Grosso no quinto lugar em morte de policiais. Eu quero saber de onde tiraram esses números. Eles não refletem essa realidade. Mandamos fazer um levantamento e uma nota dizendo qual é o número verdadeiro. 

MidiaNews – Como o Comando da PM encara as constantes expulsões de militares? Existem muitos casos em análise na Corregedoria? 

Cel.Sampaio
 – Hoje, a Corregedoria da PM está profissionalizando sua atividades. Está criando mecanismos que conseguem analisar as falhas e fazer um julgamento amplo e com direito de defesa. Existem muitos processos em análise. Se um policial apronta hoje, não podemos despedi-lo no outro dia. Não podemos mandar um policial embora sem dar a ele esse direito de defesa. Agora, estamos lançando mão de alguns recursos jurídicos para que esses processos andem e que os resultados cheguem mais rápido. Neste ano conseguimos finalizar muitos processos que estavam parados há cinco, seis anos.

 

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