O risco de uma pessoa morrer no trânsito de Mato Grosso é o dobro do que se estivesse em São Paulo. Uma pesquisa inédita no país, elaborada pela Universidade de São Paulo (USP), mede que pedestres e motoristas mato-grossenses estão sujeitos a um nível de segurança classificado como "ruim" em relação ao cenário nacional. Para cada 1 bilhão de quilômetros rodados, 74 pessoas morrem, enquanto no trânsito paulista esse índice é de 36 mortes. Conforme a pesquisa, o índice de segurança das pessoas no trânsito é diretamente proporcional aos investimentos na área. Quanto menor o volume de recursos destinados à melhoria em infraestrutura, campanhas de conscientização e fiscalização, maiores os riscos.
Na categoria "ruim" acompanham Mato Grosso, os estados de Mato Grosso do Sul, Paraná, Tocantins, Pará e Pernambuco. Entre estes, o Estado tem o pior índice, enquanto no ranking nacional ocupa a 12ª posição com mais mortes por bilhão de quilômetro rodado. Em todo o país, o trânsito do Piauí é o menos seguro, com índice de 146 mortes pelo trecho utilizado como padrão. São Paulo tem o menor índice e encontra-se na classificação "boa" no cenário nacional, assim como Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Amazonas e Amapá.
A pesquisa é inédita no Brasil, pois pela primeira vez considera a quantidade de quilômetro rodado. Levantamentos já divulgados consideravam ou o número de mortes com a população ou relacionavam com o tamanho da frota. Porém, estas taxas não traçavam o nível de segurança. O orientador do estudo e professor do Núcleo de Estudos de Segurança no Trânsito (NEST) da USP, Coca Ferraz, diz que esta metodologia vai mais a fundo e acompanha a que já é utilizada em muitos países. "É um indicador importante, porque mede a exposição das pessoas ao acidente por quilômetro rodado".
Ele compara que o risco só passa a existir quando um veículo está em movimento e não parado na garagem, por exemplo, por isso foi utilizado a quantidade trecho percorrido.
Para cada estado foi feita uma estimativa de trecho percorrido por cada tipo de veículo: motocicletas, automóveis, ônibus e caminhões. Da soma destes percursos e conforme o número da frota, a estimativa foi feita. O pesquisador e mestre em engenharia dos transportes, Jorge Tiago Bastos, explica que para chegar a este dado utilizou a quantidade de combustível vendida em cada estado, que foi fornecida pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Todos os dados empregados são de 2008. Tiago diz que o índice serve tanto para motoristas, quanto pedestres, que estão sob o risco de serem atropelados.
Ricos e pobres – O pesquisador aponta que a condição socioeconômica está diretamente relacionada ao nível de segurança. Os 13 estados classificados em "péssimo" ou "ruim", estão nesta situação. À medida que o índice de mortes cai, percebe-se que os Estados têm maior participação na economia. Para o professor da USP esta é uma constatação mundial. No Brasil, uma pessoa tem de 7 a 13 vezes mais risco de morte no trânsito do que em países desenvolvidos, como Suécia e Reino Unido. "Nós sabemos, por experiência, que países mais avançados têm infraestrutura básica e isso acontece nos estados. Aqueles menos desenvolvidos estão mais preocupados em investir em saúde e educação e não colocar a segurança no trânsito em prioridade".
Coca diz que o Governo Federal precisa engajar por uma meta de redução de acidentes com campanha maciça e que envolva os municípios, começando pela criação de uma secretaria nacional do setor que ainda não existe. Ele afirma que o trabalho do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) é tímido frente à média de 40 mil mortes, que são registras por ano no país.
Risco coletivo – O presidente do Sindicato das Empresas de Transporte Rodoviário de Passageiros do Estado de Mato Grosso (Sintromat), Júlio Cesar Sales Lima, aponta que o "maior vilão do desastre em Mato Grosso é a imprudência do condutor nas estradas". A ingestão de álcool pelos motoristas profissionais, principalmente em rodovias federais, é um fator que aumenta os riscos. "Tem que colocar a lei seca para funcionar, proibir de vender bebida alcoólica em beira de estrada".
Além disso, Júlio cita as péssimas condições das estradas, em que destaca o trecho de rodovia entre Rondonópolis e o posto Gil, em que os motoristas não encontram acostamento.
Primeiros passos – Na opinião do diretor-executivo da Associação dos Transportadores de Carga de Mato Grosso (ATC), Miguel Antônio Mendes, a condição das rodovias, como trecho da BR-364, que liga Rondonópolis a Alto Araguaia, causa desgaste enorme dos motoristas, que precisam desviar dos buracos. Mas, a situação é que a maioria motoristas não tem educação no trânsito e neste grupo estão os que pegam no volante todos os dias. "O profissional do volante não está preparado e hoje a classe empresarial, que é responsável, infelizmente não atende o segmento".
Ele reclama que o Serviço Social do Transporte (SEST), o Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (Senat) e a Confederação Nacional do Trânsito (CNT), que deveriam oferecer cursos aos motoristas, ficam devendo. Miguel destaca o aperfeiçoamento, porque progredir às classes D e E hoje na Carteira Nacional de Habilitação (CNH) é muito simples. "É fácil conseguir a categoria, porque se faz 2 aulas e vai para o teste com um caminhão vazio, com uma pequena carreta atrás e são poucas as situações difíceis que se enfrentam para ser aprovado".
Após o teste, ele diz que o motorista profissional irá trabalhar com carregamento de até 74 toneladas como é o caso dos rodotrens.
Tripé – O presidente do Departamento Estadual de Trânsito de Mato Grosso (Detran), Teodoro Moreira Lopes, reconhece que há grande reclamação de motoristas profissionais quanto à condição das estradas e avalia que nos últimos anos a malha viária do Estado não sofreu grandes ampliações. "Isso também vale para as cidades, como que se anda em Cuiabá?", diz, se referindo aos desvios de buraco.
Além da engenharia, outros 2 fatores essenciais para oferecer maior segurança, educação e fiscalização já fazerem parte da alçada do Detran. "Pratique o Trânsito Consciente" é tema da campanha, que está sendo realizada por meio de blitz, show com o campeão Joaninha e inserções em mídia. "Nós estamos fazendo, mas este é um trabalho lento de educação, que vamos sentir efeito lá na frente".
Para disciplinar imediatamente os motoristas, Teodoro destaca a fiscalização, que também é de competência dos municípios. Até julho, 70 agentes ingressarão no Batalhão de Trânsito da Polícia Militar, que estava desativado. Um grupo de policiais faz treinamento no Rio de Janeiro de blitz intensivas de combate aos infratores e o presidente do Detran pretende aplicar a fiscalização com utilização de bafômetros.
Outro lado – A assessoria de imprensa do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) informou que o trecho, de 107 quilômetros de extensão, onde as BRs 364, 163 e 070 se sobrepõem, está em obra de duplicação. O material utilizado é o pavimento rígido (concreto), que é mais resistente em percursos de serra. A previsão de conclusão até o Posto Gil é no ano de 2013. O trecho duplicado entre Cuiabá e Várzea Grande está contemplado com a construção de viadutos, passarelas, acessos e vias marginas, cujas obras estão em licitação, segundo o órgão.
Para este ano, o Dnit anuncia as obras da 2ª etapa do Contrato de Restauração e Manutenção de Rodovias (Crema), que tem o objetivo de aumentar o tempo de vida útil dos pavimentos em uma extensão de 2.148 quilômetros com investimentos de R$ 550 mil por quilômetro, chegando a um investimento total aproximado de R$ 1 bilhão. Neste tipo de contrato é feita a intervenção profunda do pavimento nos 2 primeiros anos de contrato. Nos 3 anos seguintes as contratadas ficam responsáveis pela manutenção.