Equipe do Câmera Record diz que nome do programa foi usado indevidamente

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A TV Record negou ter recebido qualquer forma de "apoio logístico" do Governo de Mato Grosso para a gravação de uma reportagem para o programa "Câmera Record", no final de 2008.

Os supostos serviços prestados a uma equipe da emissora, orçados em R$ 115,6 mil e pagos na gestão do então governador Blairo Maggi (PR), hoje no Senado, são alvo de inquérito aberto pelo Ministério Público Estadual.

A empresa contratada, Kamil Abdel Zarour M.E., apresentou ao Governo uma conta que incluía 400 diárias de garçom, 600 diárias de cenógrafo, 400 diárias de iluminador, 134 locações de palco e 5.000 conjuntos de mesas.

A equipe do programa, conforme o próprio Governo relatou em nota divulgada à época, era composta por apenas quatro profissionais e permaneceu no Estado por uma semana.

"A TV Record não recebeu em nenhum momento o apoio citado, em hipótese nenhuma na sua forma, muito menos na sua quantidade", disse, em nota , o chefe de Redação do programa, Rafael Gomide.

Segundo ele, a equipe do programa deseja que "a promotoria investigue o assunto e que a verdade sobre o caso seja estabelecida, para o bem do Estado do Mato Grosso e de sua população".
 
"Lamento profundamente o uso inadequado do nome de um programa conceituado, reconhecido e premiado pelo público e crítica", disse Gomide.

Katoomba Meeting

Além do "apoio logístico", o Ministério Público Estadual irá investigar outros três contratos firmados pelo Governo com a mesma empresa e que também apresentam quantitativos suspeitos.

Para o Katoomba Meeting, evento ambiental que durou dois dias, foram cobradas e pagas 250 diárias de locutor, 250 diárias de manobrista, 250 diárias de digitador, 250 diárias de operador de áudio e 250 diárias de serviços de tradução.

A reinauguração do Cine Teatro Cuiabá, conduzida pela Secretaria de Estado de Cultura e realizada em um único dia, exigiu, segundo a empresa contratada, o uso de 130 diárias de locação e montagem de palco.

A conta, que incluiu também 10 mil cartilhas, 10 mil blocos para rascunhos, 30 mil fotocópias e 2,5 mil conjuntos de mesa, ficou em R$ 183 mil.

Tomada de contas

Na portaria de abertura do inquérito, assinada no dia 5 de janeiro, o promotor Roberto Turim, da Promotoria de Defesa do Patrimônio Público, diz que os "possíveis danos ao erário" estão relatados em um processo que tramitou em 2010 no TCE (Tribunal de Contas do Estado).

A peça que deu origem ao processo é um relatório do auditor Edicarlos Lima Silva. 

Midianews teve acesso ao documento, que é conclusivo ao apontar que as quantidades descritas "não guardam proporcionalidade, razoabilidade e liame lógico."

"Se os serviços foram requisitados para atender as filmagens do programa Câmara Record, para que serviria os serviços de locação de palco (134), locação de mesas (5.000), locação de toalhas (5.000), serviços de garçons (400), se não houve a realização de festividades e o programa em sua maior parte foi gravado na zona rural (Nobres, Nossa Senhora do Livramento e Poconé)?", questiona o auditor, em um trecho.

Em sua conclusão, Lima Silva recomendou a suspensão de novas contratações com a empresa e a revisão de todos os pagamentos feitos pelo núcleo sistêmico que engloba as pastas de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer.

A conclusão foi seguida pelo promotor Getúlio Velasco, do Ministério Público de Contas, que defendeu ser "imperiosa a remessa dos autos ao Ministério Público Estadual para que seja apurada a conduta do gestor por meio do ajuizamento de Ação Civil Pública."

Velasco defendeu, ainda, a aplicação de multa aos então secretários Yuri Bastos Jorge (Turismo) e Paulo Pitaluga Costa e Silva (Cultura), "em razão da prática de atos ilegais, ilegítimos e antieconômicos dos quais resultou dano ao erário."

No julgamento, porém, o conselheiro Campos Neto, relator do caso, votou pela improcedência da representação. No caso do Katoomba, ele disse não ser "possível afirmar que excessos foram praticados, pois os autos não permitem essa conclusão."

Em relação ao Câmera Record, o conselheiro disse ver indícios de que serviços prestados "não são conciliáveis com o objeto do processo de pagamento". Entretanto, determinou apenas a abertura de uma tomada de contas especial pela Secretaria de Turismo. 

"Não é possível quantificar exatamente quantas diárias foram utilizadas durante o evento e, por conseguinte, dimensionar eventual prejuízo também se aplica ao caso em concreto", disse Neto, cujo voto foi seguido pelos demais conselheiros.

Central de Assessoria e Treinamento
 
Segundo o Fiplan, a Kamil Abdel Zarour foi destinatária de mais de R$ 20 milhões em empenhos por parte de órgãos estaduais, desde 2007. No ano passado, foram empenhados R$ 6,5 milhões, em 157 contratos.

Entre as primeiras diligências do inquérito, consta um pedido para que a Secretaria de Fazenda forneça um relatório de todos os pagamentos realizados pelo governo à empresa.

Sem especificar o motivo, a Promotoria também pede a relação dos repasses feitos à Central de Assessoria e Treinamento Ltda.

Outra grande prestadora de serviços em eventos do Governo do Estado (o Fiplan lista R$ 43,4 milhões em empenhos desde 2007) a empresa é de propriedade da empresária Néia de Araújo Marques, tia do empresário Kamil Abdel Zarour.

Documentos obtidos pelo Midianews na Junta Comercial mostram que, até fevereiro de 2006, tia e sobrinho eram sócios na Central de Assessoria e Treinamento.

O promotor determinou o envio de ofícios a TCE e às secretarias de Cultura e Turismo pedindo informações sobre medidas adotadas em relação aos contratos investigados.

Outro lado

A reportagem conseguiu contato com o empresário Kamil Zarour e, a seu pedido, encaminhou perguntas relacionadas aos eventos sob investigação. Até o momento, ele não enviou as respostas. 

Na defesa encaminhada ao processo que tramitou no TCE, a Secretaria de Turismo disse que a medida "diária" havia sido "erroneamente utilizada" pela auditoria. "Os serviços profissionais são fornecidos por período de 04 (quatro) horas", disse.

Em relação ao programa Câmera Record, a secretaria disse que "não se deve discutir quantidades de locação ou serviços". "O que se deve analisar é o investimento como um todo (…). Para o resultado obtido, a consagração de Cuiabá como cidade esportiva da Copa de 2014, os gastos foram modestos", disse.

A Secretaria de Cultura disse que os valores repassados à Kamil Zarour também incluíram gastos com outros dois eventos realizados no mesmo período e que apenas 24 locações de palco foram utilizadas na reabertura do Cine Teatro.

"A inauguração do Cine Teatro tinha público estimado de 700 pessoas e só havia disponibilidade física para comportar 500 pessoas, sendo necessária a complementação do espaço com palcos montados", afirmou.

A Kamil Abdel Zarour ME, em sua defesa ao TCE, defendeu os quantitativos. No caso dos manobristas do evento Katoomba, realizado no Centro de Eventos do Pantanal, disse que utilizou mais de 40 profissionais a cada turno de quatro horas.

 
O então ministro Carlos Minc, do Meio Ambiente, durante participação no Katoomba, evento realizado no Governo Blairo Maggi e que está sob investigação do Ministério Público

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