Dossiê acusa PM e agentes de tortura em presídios de MT

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Várias entidades protocolaram, nesta semana, na Secretaria de Justiça e Direitos Humanos, uma petição contendo denúncias de supostas torturas e maus-tratos em detentos do Presídio Feminino Ana Maria do Couto May (Cuiabá), da Penitenciária Dr. Osvaldo Florentino Leite Ferreira, o “Ferrugem” (Sinop), no Centro de Ressocialização de Cuiabá (antigo Carumbé) e no Complexo Pomeri.

A comissão autora da petição é formada pelo Centro de Direitos Humanos Padre Burnier, Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), Fórum Estadual de Direitos Humanos e da Terra, além de religiosos da Pastoral Carcerária e advogados da Comissão Pastoral da Terra (CPT).

De acordo com o advogado do MCCE, Vilson Nery, a comissão aguarda uma resposta positiva da pasta quanto às denúncias feitas.

As entidades pedem para que o Governo do Estado converse, reservadamente, com os detentos e, em seguida, afaste e puna todos os policiais militares (corpo de guarda) e agentes carcerários acusados de praticar tortura.

O afastamento dos diretores dos presídios citados também faz parte da petição, para que os supostos atos de tortura sejam cessados dentro das unidades carcerárias.

Caso não haja uma ação satisfatória do Estado para mudar o quadro apresentado, a comissão já avalia a possibilidade de fazer uma representação na Procuradoria da República, pedindo pela intervenção do Governo Federal, para que os problemas sejam resolvidos.

“Se o Estado não dá conta, a União pode interferir. Porque o que está acontecendo é uma grave violação dos direitos humanos, fere a um princípio sensível da Constituição Federal. Nós esperamos que o governo estadual tome as medidas administrativas cabíveis”, afirmou Vilson Nery, em entrevista ao MidiaNews.

Segundo o coordenador do MCCE, Antônio Cavalcante Filho, a busca por ajuda da União está prevista na Constituição Federal.

“A intervenção federal no Estado de Mato Grosso é válida, conforme prevê o artigo 34 inciso VII da Constituição Federal, ou seja, pela incapacidade do Estado em respeitar os direitos da pessoa humana”, afirmou o coordenador, em nota enviada à imprensa.

Nery informou ainda que, nos próximos dias 3 e 4 de fevereiro, uma comissão vai à Brasília levar as denúncias para a Comissão de Direitos Humanos (CDH) do Senado Federal, presidida pelo senador Paulo Paim (PT-RS), e à Comissão de Diretos Humanos e Minorias (CDHM), da Câmara dos Deputados, presidida pela deputada federal Manuela D’ávila (PCdoB-RS).

O advogado afirmou que a comissão deverá entregar cópia da denúncia também ao Ministério da Justiça, sob José Eduardo Cardozo. Além disso, o defensor público da Corte Interamericana de Direitos Humanos, Roberto Tadeu Vaz Curvo, também pretende levar a conhecimento dos representantes da entidade as denúncias por eles elaboradas sobre o que estaria ocorrendo nos presídios de Mato Grosso.

Denúncia

No documento, as entidades relatam abusos de PMs e agentes carcerários que, segundo Nery, agem de maneira a manter o “regime do medo”, ferindo princípio diretos humanos e violando a integridade física de pessoas segregadas ao ambiente penitenciário e que estão sob tutela do Estado.

Segundo o advogado, os presos sofrem torturas diárias e sentem medo de denunciar aos representantes do Estado, temendo ir para o “castigo”, que vai desde o isolamento e proibição do uso de colchão ou de receber comida até ser espancado ou atingido por jatos de spray de pimenta.

O advogado ressaltou o problema da superlotação e a mistura que há nos presídios de detentos provisórios e condenados. Segundo Nery, em casos de rebelião, os presos provisórios e os deficientes são os primeiros a ser usados de “escudos” pelos demais, quando a Polícia tenta acabar com a confusão por meio da força.

“Preso condenado é diferente de provisório, e eles estão misturando tudo. Não é por causa de uma minoria que tenta fazer motim que você pode sair agredindo todo mundo”, disse o advogado.

Presídio Feminino

A denúncia protocolada na Sejudh trata de maus tratos sofridos por três reeducadas que foram baleadas por policiais militares dentro de suas celas, na última sexta-feira (20), após uma tentativa de rebelião na unidade.

Uma delas, segundo Nery, é Luciene Dias da Costa, presa provisória e deficiente visual, que levou cinco tiros na perna direita, enquanto estava deitada.

A rebelião, de acordo com os dados oficiais, foi motivada porque as presas não estariam aceitando as mudanças impostas no presídio, como revistas mais minuciosas e separação de celas entre as presas condenadas e as provisórias.

No entanto, Nery afirmou que as reeducandas lhe disseram que a rebelião começou porque a direção do presídio passou a restringir visitas e proibiram a realização de cultos religiosos. Ao questionarem, elas teriam levado tapas no rosto, o que motivou a confusão.

“Algumas presas estavam revoltadas porque proibiram a entrada de alimentos e roupas para elas e desmontaram a ala evangélica, porque a direção se irritava ao ver a oração das presas. As que ousaram questionar, foram para o ‘castigo’”, disse o advogado.

Segundo ele, para agravar ainda mais a situação, os fatos foram escondidos da sociedade e os dados de feridos foram suprimidos pela Sejudh. O advogado afirmou ainda que o laudo do Instituto Médico Legal (IML) com os dados sobre a presa ferida sumiu e a família não foi informada.

“Conversei com ela, vi os ferimentos na perna direita dela. Ela tem um metro e meio de altura, estava deitada e não participou de rebelião alguma. Foi uma coisa covarde”, afirmou.

Além disso, a denúncia fala sobre o cotidiano das presas, que viveriam em meio à sujeira, ratos e insetos e ainda estariam misturadas presas saudáveis com outras doentes com tuberculose.

“Ferrugem”

Enquanto isso, no município de Sinop (505 km ao Norte de Cuiabá), o Presídio conhecido como “Ferrugem”, localizado no meio da mata, foi palco de um motim que durou alguns dias, reprimido na noite de terça-feira (24) pela Polícia Militar. A intervenção resultou na descoberta de um túnel de 15 metros, cavado pelos presos e que levava para fora do presídio.

Segundo Nery, o presídio é o mais temido do Estado não porque fica no meio da floresta, mas pelo despreparo dos servidores, que torturam os presos diariamente para mantê-los “direitos”.

O advogado afirmou que “spray de pimenta” é usado freqüentemente, sem motivo aparente, “só para deleite e prazer de servidores sádicos”. Além disso, a superlotação na unidade seria “absurda”.

“Lá tem capacidade para 300 presos e abrigam 600. Eles vivem sob o ‘regime do medo’. Quando eles chegam lá, (os servidores) tiram todas as suas roupas, raspam todo o cabelo… Isso é coisa de nazismo”, disse.

Consta na denúncia que até mesmo os advogados sofrem obstrução ao exercício de sua profissão dentro da unidade e que os presos são proibidos de denunciarem alguma coisa.

CRC e Pomeri

As entidades pedem respostas quanto às denúncias já elaboradas anteriormente e enviadas pelo Fórum de Direitos Humanos, sobre maus tratos semelhantes aos descritos nas outras unidades que estariam ocorrendo dentro do Complexo Pomeri e do Centro de Ressocialização de Cuiabá (CRC).

Consta na denúncia que “pessoas sob a proteção do Estado ainda continuam ali sendo assassinadas” e que nenhuma resposta foi dada ainda pela secretaria.

Encontro cancelado

As entidades apontaram ainda que a reunião que teriam com o secretário da Sejudh, Paulo Lessa, e a adjunta, Vera Araújo, na terça-feira (24), foi cancelada sem justificativa prévia e que o motivo seria o vazamento de informações de torturas para imprensa e que isso teria causado mal-estar no Governo Estadual.

Por meio de sua assessoria, o secretário Paulo Lessa afirmou que a reunião foi cancelada às 12h e que foi solicitado às entidades para que agendassem uma nova data para o encontro, mas que não houve recusa por parte dos responsáveis pela pasta em atender e receber as denúncias.

O documento já estaria sendo analisado e as denúncias serão apuradas, segundo a informação. 

A assessoria salientou ainda que a Sejudh nunca pactuou com nenhuma forma de violência, mas que não poderia comentar mais o assunto. Veja a materia em video.

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