Depois do ex-governador do Estado, Silval Barbosa (PMDB), a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Renúncia e da Sonegação Fiscal vai ouvir o empresário João Batista Rosa, nesta quinta-feira (8). Rosa é o delator da Operação Sodoma, que resultou na prisão do peemedebista. Acontece que ele recorreu ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) e ganhou uma liminar para ficar calado durante todo o interrogatório.
A liminar também desobriga o delator a assinar qualquer termo de compromisso de dizer a verdade. Com isso, ele vai ficar em silêncio por orientação de seu advogado, Huendel Rolim, e não poderá sofrer qualquer sanção. A liminar autoriza ainda que João Rosa seja assistido por seu defensor e possa se comunicar com o advogado a qualquer tempo no decorrer da oitiva. Pela liminar, dada pelo desembargador Alberto Ferreira de Souza nesta quarta-feira (7), o advogado poderá, inclusive, intervir verbalmente quando for necessário.
Vale destacar, que Silval Barbosa, ao ser interrogado, também optou por ficar calado e não respondeu aos questionamentos dos integrantes da CPI, mesmo não tendo uma liminar que o beneficiasse.
Em sua delação, João Batista, sócio proprietário do Grupo Tractor Parts, revelou ter pago propina de R$ 2,5 milhões ao grupo que era, segundo ele, chefiado por Silval Barbosa, mas tendo o ex-secretários de Indústria e Comércio do Estado Pedro Nadaf, à frente das cobranças e até “intimidações” para que ele continuasse efetuando as parcelas da propina.
Na época dos fatos Nadf era o secretário de Estado da Indústria e Comércio, Minas e Energia (Sicme), a quem cabia a viabilização do beneficio de incentivos ficais. Conforme relata o Ministério Público, desde meados de 2006 as empresas de João Batista enfrentavam dificuldades burocráticas, impostas pela Sefaz/MT, para se beneficiar de crédito de ICMS, acumulados em operações de vendas e transferências interestaduais de mercadorias, no valor aproximado de R$ 2,6 milhões.
Foi então que ele procurou Pedro Nadaf dizendo que possuía o tal crédito de ICMS e pediu auxílio ao então secretário para o recebimento do crédito e também solicitou a concessão do benefício do Prodeic. Suas empresas passaram a receber os benefícios do Prodeic, usufruindo de redução da base de cálculo de ICMS na aquisição de mercadorias, mas para a obtenção do benefício, foi obrigado desistir do crédito de ICMS. Em seguida, passou a ser assediado, quando lhe foi exigido que o mesmo auxiliasse no pagamento de dívidas de campanha, ao grupo político do então governador Silval no valor de aproximadamente R$ 2 milhões.
O ex-governador Silval, os ex-secretários de Estado Pedro Nadaf (Casa Civil), Marcel Souza de Cursi (Sefaz), Francisco Andrade de Lima Filho (ex-procurador do Estado), Sílvio Cezar Corrêa Araújo (ex-assessor de Silval) e Karla Cecília de Oliveira Cintra (ex-assessora de Nadaf) foram denunciados e vão responder, caso a Justiça acate a denúncia, pelos crimes de constituição de organização criminosa, concussão, extorsão e lavagem de dinheiro.
Veja a íntegra da decisão
Liminar Deferida
Tem-se em perspectiva habeas corpus preventivo, com instância por tutela de urgência, manejado pelo advogado Huendel Rolim e outro em favor de João Batista Rosa, em vias de ser submetido, em tese, a constrangimento ilegal creditado ao Presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembleia Legislativa de Mato Grosso – denominada “CPI da Renúncia e Sonegação Fiscal” –, que aprovou, em 23/09/2015, a convocação do paciente para prestar depoimento, designado para 08/10/2015, sendo intimado em 05/10/2015 [doc. fl. 16-TJ].
À moda de defesa, aduzem os impetrantes, em apertada síntese, que os Deputados requerem que o paciente fale sobre os fatos já relatados no Inquérito Policial n. 070/2015, devidamente judicializados, revelando ser premente a necessidade de assegurá-lo o direito ao silêncio, máxime porque o acordo de colaboração por ele ultimado foi entabulado com o Parquet Estadual e não com a CPI sobredita.
Demais disso, realçam, com fincas na denúncia já formulada em desfavor dos envolvidos, a indisputável influência dos investigados sobre a CPI, fator que está a desvelar o animus político criado na comissão parlamentar, “[…] que poderá apenas buscar aproveitar-se da hipossuficiência do colaborador para, a pretexto de investigar, lançar mão de uma tortuosa investida ao Paciente” [fl. 07-TJ], confrontando a sua palavra, em descompasso com o due process of law.
Propugnam, pois, a concessão liminar da ordem, para que seja expedido Salvo Conduto em favor do paciente, para: i) que não seja obrigado a assinar qualquer termo de compromisso de dizer a verdade; ii) que possa permanecer em silêncio em todo seu depoimento, sem que sofra qualquer sanção; iii) que seja assistido por seu advogado e com esse possa se comunicar pessoal e/ou reservadamente a qualquer tempo no decorrer da oitiva, sendo asseguradas todas as prerrogativas profissionais previstas em lei, inclusive a de intervir verbalmente, quando se revelar necessário, medidas estas que anelam ver roboradas ao cabo da peleja. Juntaram documentos.
Empós desvelado exame dos elementos de convicção jungidos aos autos, foi-nos dado lobrigar o potencial constrangimento ilegal a ser suportado pelo paciente, impondo-se-nos, dessarte, conceder a tutela de urgência reclamada.
De proêmio, avulta reconhecer a adequação do meio processual ora utilizado, máxime diante da hodierna orientação pretoriana que sinaliza ser oponível às Comissões Parlamentares de Inquérito a garantia constitucional contra a autoincriminação e, por via reflexa, o direito ao silêncio quanto às perguntas cujas repostas possam comprometer o depoente [Medida Cautelar no Habeas Corpus 129.824/DF, Rel. Min. Luiz Fux, DJE 19/08/2015], máxime se considerados, em última análise, os potenciais revérberos no “status libertatis” do paciente.
De feito, o fumus boni iuris se nos assoma palmar, mercê da densidade jurídica subjacente à temática a dizer com direito ao silêncio – inarredável, frise-se, dada a contextura emoldurada na inicial –, referindo-se, por óbvio, ao direito do paciente se calar para não se autoincriminar, contando inclusive com a assessoria de seus advogados [art. 5º, LXIII, CF], sobretudo diante dos laivos a indicarem a possível extorsão suportada pelo paciente e praticada, em tese, pela organização criminosa dada à estampa no bojo da “Operação Sodoma”, especialmente por PEDRO NADAF, que chegou a supostamente utilizar o nome do Deputado Estadual Emanuel Pinheiro, membro da CPI retro mencionada, para intimidar o paciente e denotar a sua influência política, consoante exposto na denúncia já ofertada pelo Ministério Público [fl. 78-TJ].
Outrossim, o periculum in mora ressai induvidoso, já que o depoimento do paciente está previsto para o dia 08/10/2015, às 14h00min, consoante documento de fl. 16-TJ, o que desvela a urgência da medida ora postulada.
Destarte, em ordem a obviar qualquer sorte de constrangimento quando do depoimento a ser prestado pelo paciente na Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembleia Legislativa de Mato Grosso e considerando a inelutável dissociação entre o acordo de colaboração efetivado entre o paciente e o Ministério Público Estadual e o depoimento a realizar-se naquela Casa Legislativa, a concessão da tutela de urgência vem de ser imperativa no caso sub examine.
Logo, deferimos a instância por liminar, para que o paciente, por ocasião do seu depoimento na “CPI da Renúncia e Sonegação Fiscal”, i) não seja obrigado a assinar qualquer termo de compromisso de dizer a verdade; ii) possa permanecer em silêncio em todo seu depoimento, sem que sofra qualquer sanção; iii) seja assistido por seu advogado e com esse possa se comunicar pessoal e/ou reservadamente a qualquer tempo no decorrer da oitiva, sendo asseguradas todas as prerrogativas profissionais previstas em lei, inclusive a de intervir verbalmente, quando se revelar necessário.
Comunique-se, incontinenti, o Presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito da Renúncia Fiscal e Sonegação Fiscal – CPI/RFSF, Deputado Zé Carlos do Pátio.
Requisitem-se informes da autoridade averbada de coatora.
Empós, sejam os autos à Procuradoria-Geral de Justiça.
Intimem-se os impetrantes.
Cuiabá, 07 de outubro de 2015.
Des. Alberto Ferreira de Souza