Compartilhar, por exemplo, em um blog pessoal textos, músicas e imagens encontrados na internet exige uma série de cuidados para evitar que sejam desrespeitadas as regras descritas pela legislação brasileira, principalmente a Lei do Direito Autoral.
Criada em 1998 para garantir os direitos e valorizar o trabalho que quem produz obras intelectuais (textos, livros, músicas, peças teatrais, imagens, entre outras), essa lei não passou por uma grande atualização nos últimos anos, mesmo com a popularização cada vez maior da internet, que hoje permite uma experiência de comunicação e compartilhamento praticamente inexiste no final do século passado.
No que diz respeito às músicas, o Ecad (Escritório Central de Arrecadação e Distribuição) é o órgão privado instituído por lei para cobrar pela execução de música em locais públicos e repassar parte dos valores aos detentores do direito da obra.
Então, para executar uma música publicamente, pessoas físicas e jurídicas precisam, de acordo com a legislação, solicitar previamente uma autorização ao Ecad, que fará a cobrança baseada em uma tabela – disponível no site do Ecad – com valores diversos de acordo com o tipo de execução. A reprodução de uma música ambiente, por exemplo, em um site pessoal, custa R$ 50,37.
Recentemente, o Ecad emitiu boleto de cobrança para blogs que embedaram em seus posts vídeos do YouTube e Vimeo em seus posts. Inicialmente, o órgão disse que estava amparado pela lei. Após protesto formal por parte do Google, dono do YouTube e de milhares de internautas, o Ecad cancelou a cobrança, disse que o episódio foi isolado e que a cobrança a sites pessoais está suspensa até que a empresa termine de reavaliar os critérios para esse tipo de cobrança.
O blog Caligraffiti foi classificado pelo Ecad na categoria de webcasting (transmissão de programas originários da própria internet) com conteúdo de entretenimento geral. Para esses casos, a cobrança mensal é de R$ 352,59.
A atuação do Ecad é bastante polêmica. Uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) foi aberta no Senado no ano passado para investigar suspeita de irregularidades no repasse do dinheiro arrecadado.
Segundo Isabela Guimarães, especialista em direito digital do escritório Patricia Peck Pinheiro Advogados, esse caso levantou um debate já antigo sobre a necessidade da reforma na Lei do Direito Autoral, para que a legislação seja mudada de acordo com a realidade atual, em que compartilhar músicas, textos e imagens na internet é tarefa comum a milhões de pessoas.
— Pela ótica da legislação brasileira atual, uma pessoa que faz um vídeo e usa uma trilha, está sim infringindo direitos autorais e seria interessante que ela fizesse o recolhimento do valor junto ao Ecad, mas evidentemente, a prática revela que nem sempre isso é possível ou o valor do recolhimento é muito caro. Há também a interpretação de que exigir isso na internet é uma maneira de engessar a liberdade de expressão na rede. Seria como não compreender a própria lógica da internet. A lei tem que valorizar o trabalho dos autores, mas ao mesmo tempo a gente tem que garantir o acesso de todos ao conhecimento, à informação, à cultura. É preciso haver um equilíbrio. Se a lei não está de acordo com a realidade, ela se torna ineficaz, vira um mico jurídico.
O direito autoral tem uma importância privada, que é de referenciar o autor sempre que sua obra for divulgada e um papel público, de ligar o autor de uma obra a seu público.
Quando essa ponte não funciona porque a lei é muito restritiva, acaba criando mais empecilhos a essa troca do que a estimula, segundo Guilherme Varella, advogado do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor). Para ter esse direito não é necessário registrar a obra em órgãos oficiais.
— A gente ter uma lei que não dá conta dessa troca, do compartilhamento, da colaboratividade, é preocupante. E a Lei de Direito Autoral desconsidera tudo isso porque foi criada em um tempo em que ainda não havia todas essas possibilidades tecnológicas. A internet não era presente no cotidiano da população brasileira como ela é hoje.
|
|||
Textos | |||
• Não copie textos escritos por outra pessoa. Você pode usar trechos, mas não deixe de citar o autor e coloque o link direto para o conteúdo original. • Ao usar partes de um texto que foi escrito por outra pessoa para fazer sua crítica sobre o mesmo assunto, tome cuidado para não distorcer a ideia do autor. • Não assuma a autoria de algo que você não sabe quem escreveu. Pesquise e se mesmo assim não encontrar o autor, explique que colocará o crédito assim que tiver essa informação. |
|||
Músicas | |||
• Pela lei, não é permitido pegar uma música e colocá-la como trilha sonora de um vídeo no YouTube, por exemplo, sem autorização de quem detém os direitos patrimoniais sobre essa obra – geralmente a gravadora. • O Ecad pode cobrar por músicas usadas na produção de podcasts publicados na internet. Então, use músicas que fazem parte do domínio público e sempre cite o título e o compositor. • Não coloque arquivos de músicas para download sem autorização. |
|||
Fotos e vídeos | |||
• Um fotógrafo tem total direito sobre sua foto. Por isso, não é permitido manipular fotos de outras pessoas sem prévia autorização. • Cuidado ao utilizar imagens (fotos, esquemas, ilustrações, charges, etc.) de sites como o Google Imagens. Observe que tipo de licença tem a imagem que você quer usar em seu blog. • A Wikimedia Commons, da Wikipédia, tem imagens gratuitas que podem ser usadas de diversas maneiras. O serviço Flickr também tem fotos com permissão para serem reproduzidas com o devido crédito. • Lembre-se sempre de citar o nome do fotógrafo e o local em que uma imagem foi encontrada. • Embedar vídeo não é crime e a Lei de Direito Autoral não trata desse assunto de maneira específica. |
|||
Consultoria: Isabela Guimarães, advogada do escritório Patricia Peck Pinheiro; Renato Opice Blum, advogado |
Brasil tem regime fraco
Varella participou de uma pesquisa anual internacional em que o Brasil aparece como um dos cinco países que tem os piores regimes de direitos autorais do mundo entre 30 países estudados.
O levantamento IP Watchlist 2011 foi feito pela Consumers Internacional – federação que congrega entidades de defesa do consumidor em todo o mundo, incluindo o Idec e leva em conta questões como as possibilidades trazidas pela lei autoral para o acesso dos consumidores a serviços e produtos culturais, exceções e limitações para usos educacionais das obras, preservação do patrimônio cultural, acessibilidade, adaptação da lei aos novos modelos digitais e utilização privada dos bens culturais.
A lista dos cinco países pior colocados no ano passado tem a Tailândia em primeiro lugar, como o país com as piores leis, seguido pelo Chile, Reino Unido, Brasil e Bielorrússia. A edição deste ano ainda não foi divulgada.
O anteprojeto de revisão da Lei do Direito Autoral atualmente está na Casa Civil depois de receber contribuições de pessoas físicas e jurídicas por meio de consulta pública no Ministério da Cultura. Não há previsão de data para que o documento seja analisado e enviado ao Congresso Nacional, onde deve ser votado.
Diferentemente das duas gestões anteriores do Ministério da Cultura, o trabalho da atual ministra Ana de Hollanda já foi muito criticado por não defender claramente a necessidade urgente de uma reforma na lei.
O R7 entrou em contato com o Ministério da Cultura, que até a publicação dessa reportagem não comentou as polêmicas sobre direito autoral que envolvem a atual gestão. Já o Ecad informou que não comenta o anteprojeto por não conhecer o seu teor.
Citar a fonte e indicar o link é essencial
Com ou sem uma reforma na Lei do Direito Autoral, um blogueiro, por exemplo, tem responsabilidade direta sobre o que publica em sua página.
O advogado Renato Opice Blum explica que a violação de direito autoral é um crime previsto no artigo 184 do Código Penal Brasileiro. A pena varia de três meses de detenção a 4 anos de reclusão ou multa.
Muitas condenações são convertidas para penas alternativas, retratação ou indenização por danos morais.
— Na dúvida ao utilizar algum material encontrado na internet, o ideal é tentar encontrar em contato com o autor do que você vai usar. Também é importante não esquecer de citar a fonte e colocar um link direto para a página em que o conteúdo foi encontrado.
O portal Domínio Público (www.dominiopublico.gov.br) tem muitas imagens, sons e textos que podem ser utilizados sem esbarrar em problemas com a lei porque expirou seu prazo de proteção de direito autoral – que no Brasil dura até 70 anos a partir da morte de seu criador.
O advogado também recomenda que os internautas fiquem atentos ao tipo de licença ao qual o conteúdo de uma obra intelectual está baseada. São vários tipos, uns mais restritivos e outros menos. Quem define e anuncia essa licença para sua obra é quem detém os seus direitos. O site Creative Commons (http://creativecommons.org.br) explica os diferentes tipos.