Em época de disputa da Copa do Mundo, que se inicia agora em junho, e preparação para a Olimpíada do Rio, alguns poucos olhares se voltam para a Seleção Brasileira de futebol feminino. A capacidade técnica de jogadoras como Marta e Cristiane, porém, mascara a verdadeira situação da modalidade no país, que ainda é vista com reservas, ao menos no que diz respeito ao reconhecimento dos profissionais envolvidos e na cobertura por parte da mídia em geral.
Proibido no país de 1941 a 1979, o futebol feminino sofreu as consequências da falta de valorização, ainda que as mulheres, em um ato de resistência, não tenham deixado de jogar – clandestinamente – durante os anos de proibição. As sequelas desse atraso são sentidas até hoje, apesar de algumas ações esporádicas para alavancar seu crescimento. Uma dessas ações foi a inauguração da exposição “Visibilidade para o futebol feminino’, que reúne acervos de atletas e outras personagens importantes e está em exibição no Museu do Futebol, em São Paulo, ambiente até então praticamente exclusivo do futebol masculino.
“Essa exposição é um marco para a história do esporte no Brasil porque reconhece a presença das mulheres no futebol. Tê-las no Museu do Futebol, uma referência da memória esportiva brasileira, é muito significativo porque incita o público a pensar sobre essa presença, a desmistificar a ideia de que o futebol é um esporte de homens e que as mulheres pouco se envolvem com esta prática’, diz Silvana Goellner, co-curadora da exposição e coordenadora do Centro de Memória do Esporte da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul).
Para a jornalista Luciane Castro, especialista em futebol feminino e que auxilia na curadoria da exposição, o esporte tem apresentado crescimento nos últimos anos, especialmente em termos de competição. “Temos a Libertadores desde 2009, temos o Brasileiro desde 2013 e temos as seleções de base também. É um avanço’, afirma. Contudo, reconhece que o olhar machista que paira sobre o futebol feminino ajuda a desacelerar esse crescimento. “Vejo machismo na cultura latino-americana. Por aqui (no Brasil), as editorias esportivas se limitam a cobrir toda e qualquer derrota da seleção ou qualquer outro fato triste em relação às jogadoras. Temos assunto para falar, muito além das embaixadinhas ou escândalos’ diz a blogueira do LANCE!Net.
A observação de Luciane sobre a cobertura da mídia ganha coro de Silvana, que vê nesse comportamento um fator determinante para o esporte se manter em uma espécie de espaço oculto: “São poucas as matérias e várias delas, quando produzidas, não narram aspectos relacionados às habilidades técnicas e táticas das jogadoras e suas conquistas, mas aspectos relacionados, por exemplo, à sua beleza e aparência’.
Mas o que fazer para mudar esse quadro e colocar o futebol feminino nos trilhos do desenvolvimento? Tanto para Luciane quanto para Silvana, a modalidade precisa se aproveitar do momento atual de pautas e debates sobre feminismo, que cada vez mais ganham força em nossa sociedade. “Está na hora de olharmos criticamente para essa realidade para que possam ser corrigidas as assimetrias e desigualdades conferindo às mulheres o respeito e reconhecimento que merecem’, opina Silvana.
Já a jornalista aposta em um posicionamento mais forte também por parte das atletas nesse aspecto. “Sinto uma certa inércia das jogadoras. Não todas, claro, mas de uma boa parcela delas no que diz respeito à exigência de um tratamento mais digno e respeitoso. Enfim, questões puramente de gênero. É preciso ter um espírito combativo e pensar além do momento. É preciso pensar a luta para as próximas gerações’, completa Luciane.