Paulo Henrique Ganso, Neymar, André, Rafael, Tiago Alves, Felipe Anderson, Crystian… Narciso dos Santos tem orgulho, sim, de ajudar a revelar valores – “e não apenas para o Santos, mas para a seleção brasileira”.
O ex-volante, que dirigiu a equipe sub-20 do clube em fase de ouro, reconhece que “não é todo dia que se tem uma safra dessas”, mas diz pensar que sua maior contribuição tenha sido fazer os garotos acreditar no trabalho, tendo como meta chegar à equipe principal e à seleção, por sua credibilidade e exemplo.
Hoje, 11 anos depois de um transplante de medula, da volta ao futebol e depois do início como técnico, está fora do Santos “e com uma grande dúvida: seguir com a base ou dar um passo maior?”.
– Esses são joias do Santos. Mas a direção mudou e o pensamento das pessoas que entraram é diferente do que estava acontecendo. Nas categorias de base, não se precisa ganhar; o que se precisa é revelar – ganhar vem como consequência. Não se pode botar pressão em garotos para ganhar, mas sim para melhorar, dia a dia.
Foi assim que Narciso, depois que deixou o futebol profissional, se propôs a trabalhar com essas categorias de base do Santos.
– E realmente não é fácil. Adolescentes, nessa fase de 17 anos, é difícil de lidar com hormônios à flor da pele. E Santos é uma cidade pequena e eles jogam em um time grande, a noite é animada, as meninas estão por lá… A maioria tem dificuldade de se focar na profissão, lembrar a importância de preservar o corpo, de ter descanso, alimentação adequada…
Teto salarial na base
Paulo Henrique Ganso, assinala Narciso, é mais tranqüilo; Neymar, mais extrovertido. Sempre foram assim. Já eram da base do Santos, diz Narciso, ao contrário de André, por exemplo, que trouxe do Cabofriense.
– As categorias de base são bem diferentes em suas faixas etárias. A sub-20 é mais objetiva, está a um passo do time profissional – é um último estágio e o treino tem de ser mais forte. A pressão também é maior e, por isso, os valores têm de estar mais centrados. Daí, acredito, a importância de ter um técnico em que possam acreditar, que passe a vivência para eles, que possam se espelhar como profissional.
Para Narciso, seria preciso encontrar um meio de se colocar um teto no que se paga às categorias de base.
– Não precisa pagar esses valores todos. A não ser para alguém que seja tão diferenciado, como o Neymar, que é um talento desde que tinha 13, 14 anos. Agora, no geral está um pouco exagerado… Nem é bom para o grupo, não fica um ambiente legal. É uma preocupação a mais.
Segredo de bom técnico
Narciso lembra aí da importância da orientação, da família dos jogadores.
– Nessas categorias, é mais fácil, porque não tem a mídia toda. Eles acreditam no que você fala. O segredo do bom técnico de futebol é esse: fazer com que os jogadores acreditem no que fala para eles.
Alan Patrick, Crystian, Elivélton, Tiago Alves, Felipe Anderson… Realmente, reconhece Narciso, “não é toda hora que se consegue uma safra dessa – Rafael [goleiro], ainda vai ser chamado para a seleção, acredito que o Vladimir [outro goleiro] também. Diego Moná, Diego Faria…”
– Sempre digo que tamanho e força não é o principal. Primeiro, é preciso qualidade técnica – o resto se conquista. Mas os dirigentes precisam ter na cabeça isso, que categoria de base é para revelar, não para ganhar.
De toda forma, o jogador precisa ter sua compensação financeira, diz Narciso, porque a carreira é curta – dez, 12 anos.
– Dizem que “o cavalo não passa selado duas vezes”; outros, que “pode passar mais cinco vezes, quem vai saber”… Mas, para mim, o foco tem de ser o time profissional do Santos. Ser primeiramente reconhecido no Brasil para depois pensar em ir para fora. Assim, estará com uma cabeça melhor, com experiência maior.
Ouvir, refletir – e decidir
Mas como tratar, por exemplo, o caso de Paulo Henrique Ganso – que está entre ficar no Santos e seguir para o Exterior?
– Pergunto: e se, depois da cirurgia, não voltasse a jogar – o que o Santos ia fazer com ele? É uma oportunidade, você vai ajudar a família, garantir uma geração que vem atrás, inteira. Não é questão de o torcedor achando que é mercenário – não vai deixar de gostar do clube que o revelou. Mas um jogador como o Paulo Henrique, de 20, 21 anos, não tem a experiência que eu, aos 37, tenho. Por isso, acho que ele deve ouvir empresários, familiares, sim, e refletir: “Será que já estou pronto para isso?” É isso que ele tem de pensar. “Quero isso para mim agora, ou mais para frente?” Tem de ouvir, refletir… E decidir o mais rápido possível.