Investimentos em pesquisas e experimentos estão por trás do sucesso de MT

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Jairo Sant’Ana | 

Mato Grosso não se transformou num dos celeiros de alimentos do mundo por acaso, pelo menos é o que avalia um dos mais antigos extensionistas em atividade no Estado.

Hortêncio Paro é um dos mais antigos profissionais em atividade no Estado, que comemora 271 anos nesta quinta-feira (9) – Foto por: Christiano Antonucci Secom MT














È comum exaltar Mato Grosso pela sua pujança na produção de soja, algodão, milho e carne, especialmente a bovina. Em verdade, o Estado responde por quase 10% da safra mundial de soja, com mais de 32 milhões de toneladas; por 66,4% da safra nacional de algodão tanto em caroço (4,39 milhões de toneladas) quanto em pluma (1,75 milhão de toneladas); e por um terço da safra nacional de milho, com 29,7 milhões de toneladas.

Além disso, possui o maior rebanho bovino nacional, com mais de 30 milhões de cabeças, e respondeu, em 2018, por 17% dos abates em todo o país (5,4 milhões de cabeças). Mas, como atingiu este estágio, se há menos de 50 anos era essencialmente extrativista? Nada melhor para contar a história desta evolução do que um dos mais antigos extensionistas em atividade no Estado, com 47 anos de serviços prestados ao setor.  

Vindo do Paraná, Hortêncio Paro, hoje com 75 anos, chegou em Mato Grosso em 1972 – portanto, antes da divisão, que ocorreria em 1977 – para trabalhar na Acarmat (Associação de Crédito e Assistência Rural de Mato Grosso), precursora da Emater (Empresa Mato-grossense de Assistência Técnica e Extensão Rural) e da Empaer (Empresa Mato-grossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural), surgida da fusão entre Emater, Codeagri (Companhia de Desenvolvimento Agrícola) e Empa (Empresa de Pesquisa Agropecuária).

“Comecei em junho de 1972, em Fátima do Sul (hoje Mato Grosso do Sul), em um assentamento com áreas de 33 hectares cada. Atendia tanto no setor agrícola quanto pecuário”, diz Hortêncio Paro, que trabalhou ainda em Dourados e Três Lagoas, ambas em Mato Grosso do Sul.

No final daquele mesmo ano, a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) foi criada e, dois anos depois, a Embrater (Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural), extinta em 1990.  “A Embrapa, para gerar conhecimento agropecuário, e a Embrater, para difundir, por meio da extensão rural, este conhecimento aos produtores”.

“A partir disso, tudo começou a andar. Foi criado o Polocentro (Programa de Desenvolvimento dos Cerrados), em 1975, construiu-se a sede da Emater, em Cuiabá, e o seu Centro de Treinamento, em Várzea Grande. A extensão rural foi a alavanca do crescimento do agronegócio mato-grossense”.

Em 1976, retornou a Cuiabá e iniciou o Projeto Soja. “Criamos uma pequena equipe na Emater e implantamos oito trabalhos de pesquisa da soja. Em março de 1977, fizemos na região de Rondonópolis o primeiro Dia de Campo em Mato Grosso, para apresentar as variedades e mostrar o grande potencial da soja no Cerrado.”

 

Hortêncio Paro em um dos primeiros dias de campo da soja em Mato Grosso. Foto: Emater

Em 1978, ao lado de cinco outros brasileiros, Paro foi estudar nos Estados Unidos, onde conheceu Edgard Hardwig, segundo ele, o maior melhorista de soja do mundo. “Já naquela época, ele me dizia: ‘quando vocês descobrirem que têm chuva para duas safras em uma só, vocês darão um susto no mundo. Hoje, estamos fazendo isso. Plantando soja no início e milho no final, na safrinha, consorciado”.

Em 1979, trouxe do Instituto Agronômico de Campinas, a IAC 2, considerada por ele o pontapé da soja em Mato Grosso, cuja produtividade girava em torno de 30 a 35 sacas por hectare, bem inferior às quase 70 sacas (de 60 kg) da safra 2017/18, por exemplo.

“Depois vieram outras variedades como a IAC 6, IAC 7, IAC 8 e Cristalina. Mas quem abriu as portas para que Mato Grosso chegasse aos atuais 9,7 milhões de hectares plantados foi a IAC2”.

Paro afirma que sempre contou com apoio e suporte técnico-científico da Embrapa, tanto por meio do Centro Nacional de Pesquisa da Soja, quanto do Centro de Pesquisa Agropecuária do Cerrado, que, em sua opinião, fez um grande estudo sobre como fertilizar o Cerrado sem causar danos ao solo. O resultado foi o Manual de Abertura e Manejo de Solos do Cerrado, cuja elaboração contou com apoio das unidades estaduais das Emater.

“Nunca perdi uma reunião do Plano Nacional de Pesquisa, seja na área de entomologia (para saber como controlar os insetos), seja de patologia (para estudar as doenças da soja) ou, ainda, da comissão de melhoramento, para conhecer as novas variedades. Desta forma, consegui ferramentas tecnológicas suficientes para assessorar os produtores mato-grossenses”.

Olacyr de Moraes, um dos percursores do algodão

Paro diz ter conhecido Olacyr de Moraes, já falecido, considerado nos anos de 1980, o maior produtor individual de soja do mundo (título que mais tarde seria herdado pelo ex-governador e ex-ministro Blairo Maggi e seu primo Eraí Maggi), no evento “A tecnologia no futuro da soja no Brasil”, em Goiânia.

Um dos primeiros grandes empresários a investir em Mato Grosso – em 1967 passou a criar e engordar gado e, em 1975, a produzir soja, milho e algodão em uma área de 120 mil hectares na região da reserva dos Parecis.

“Ele foi o percursor do Médio Norte. Em função de suas lavouras, abriram os primeiros postos de gasolina, construíram as primeiras estradas. Também foi ele quem lançou a primeira variedade de algodão na região”, diz Hortêncio Paro.

Segundo Paro, que também coordenou o Projeto Algodão em Mato Grosso, tudo começou em uma palestra feita em São Paulo, quando foram apresentadas variedades experimentadas em Nova Galileia e São José do Povo (na região de Rondonópolis).

“Comecei a mostrar slides e a plateia, formada pelo próprio Olacyr de Moraes, Bolsa de Mercadoria e Futuro e Carteira de Comércio Exterior do Banco do Brasil, se assustou. Nossa produtividade era bem superior à até então conhecida, que não ultrapassava 150 arrobas por hectare”.

Paro diz que, no início da década de 1990, Olacyr de Moraes, ao lado de Ignácio Mammana, firmou um convênio com a Embrapa, resultando na variedade de algodão ITA 90, considerado de alta produtividade e revertendo a situação do Brasil, que passou de grande importador a um dos grandes exportadores do mundo. “Havia o problema da doença azul, mas foi com esse material que começamos”.

Outros cotonicultores foram pioneiros no Cerrado, como Benjamim Zandonadi e Mario Patriota, que iniciaram o cultivo na região sul de Mato grosso a partir de 1991.

Dia de Campo de algodão. Foto: Emater 

“A explosão do algodão em Mato Grosso começou tanto com o Proalmat (Programa de Incentivo à Cultura do Algodão de Mato Grosso), quando com o Facual (Fundo de Apoio à Cultura do Algodão), ambos criados durante o governo de Dante de Oliveira (1994-2002)”, conclui Hortêncio Paro.  

Para se ter uma ideia, antes da criação do Proalmat, em 1998, o governo arrecadava R$ 2,3 milhões em impostos com algodão. Seis anos depois, a arrecadação atingiu R$ 26 milhões, mesmo com todos os incentivos concedidos aos produtores.

Milho safrinha: produtividade quadruplicada em três décadas

O vaticínio do melhorista americano Edgard Hardwig, de que Mato Grosso assustaria o mundo ao realizar duas safras (de soja e milho) em uma só, se concretizou. Atualmente, o principal sistema de cultivo do milho no Estado é da safrinha, logo após a colheita da soja, realizada no início do ano.

Segundo Hortêncio Paro, tudo começou, quando o Banco do Brasil, baseado no que estava acontecendo em Dourados (MS), pediu a elaboração de um sistema de produção para a safrinha.

“Nos unimos à Embrapa e reunimos os agrônomos mais experientes da região da Grande Dourados, Jaciara e Alto Taquari para decidir a tecnologia a ser usada e as melhores épocas do ano para o plantio – não só do milho semente, como também do sorgo e do mileto”.

Até então, o cultivo era em pequena escala. Mas, com o surgimento de agroindústrias na parte sul de Mato Grosso nas décadas de 1980 e 1990, gerou-se uma demanda maior, incentivando a produção.

No início da década de 1990, o cultivo do milho safrinha começou a ganhar espaço. O fato de se conseguir cultivar duas culturas por ano agrícola permite ao produtor otimizar a utilização de máquinas e de equipamentos agrícolas.

Mesmo com potencial produtivo menor que o milho da primeira safra, a produção da safrinha é a principal de Mato Grosso. A produtividade média vem superando recordes. No início da década de 1990, era de 1.500 kg por hectare, passando para 3.650 kg em 2006, enquanto, na safra atual (2018/19), o sétimo levantamento da Conab prevê uma produtividade de 6.157 kg por hectare. Mais que quadruplicou nestas três décadas.


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