A proposta indica que as conversas “com médicos e outras instâncias envolvidas nesse tipo de assistência” teriam começo imediatamente. Após o debate, o Legislativo deverá incorporar uma exceção no texto legal sobre a ajuda ao suicídio, regulado até agora apenas com vistas a despenalizar a eutanásia, mesmo assim sob condições rigorosas. Levando-se em conta que as próximas eleições legislativas estão previstas para 2017, o mais provável é que a aprovação da nova norma caiba a um novo Executivo.
A mudança na posição oficial se choca com as conclusões da comissão encarregada em fevereiro de examinar o conceito (e as consequências) de uma “vida esgotada”. Elaborado sob a supervisão do senador liberal esquerdista Paul Schnabel, o relatório indicava que “a maioria dos que se sentem assim, e desejam morrer, sofrem ao mesmo tempo de uma enfermidade e se encaixam nas premissas da eutanásia”. Os médicos, por sua vez, qualificam a eutanásia como “último recurso” e não querem que seja considerada um direito pela população. São os médicos de cabeceira que a praticam e querem evitar pressões de familiares ou dos próprios pacientes. Na época, os liberais de direita e esquerda e o partido dos ecologistas se mostraram favoráveis à ampliação do raio de ação da eutanásia. Os grupos religiosos, tanto protestantes quanto calvinistas, apoiaram o relatório Schnabel.
Em 2014, as cinco comissões que revisam a legalidade das eutanásias praticadas no país registraram 5.306 casos (10% a mais que no ano anterior). Quase 75% dos doentes tinha câncer; quase 41% apresentava problemas psiquiátricos.
Em 2013, a abertura da Levenseindekliniek (Clínica para Morrer), a primeira instituição privada do gênero, revolucionou a própria aplicação da lei. Em seu primeiro ano de atividade, recebeu 714 solicitações, das quais praticou 104. Como as doenças físicas monopolizam as eutanásias da saúde pública, recorrem à nova clínica aqueles que haviam sido rejeitados por terem problemas psiquiátricos e diversos graus de demência. A tendência de crescimento nesse grupo se manteve nos anos seguintes.
Em janeiro deste ano, o Ministério da Saúde adotou um novo protocolo que suavizava as exigências em casos de demência aguda. Esta sempre foi uma das denominadas zonas cinzentas da lei, porque excluía, segundo os críticos, os afligidos pela perda de faculdades mentais, progressivas e irreversíveis na maioria dos casos estudados. Até então, os legisladores consideravam muito difícil saber se o paciente tinha certeza e compreendia as consequências do seu desejo. Agora, a eutanásia pode ser aplicada em fases avançadas da deterioração, desde que o solicitante tenha assinado uma declaração formal quando estava consciente, na presença de seu médico. Se não a tiver, a pena pode ser a prevista pela norma desde 2002: até 12 anos de prisão.
Leis sobre morte digna
M. R. SAHUQUILLO
Os países que já legislaram para permitir uma morte digna normalmente traçam uma distinção entre o suicídio medicamente assistido e a eutanásia. A diferença está em quem administra os fármacos que põem fim à vida.
Suicídio medicamente assistido. Consiste em fornecer ou receitar ao paciente os medicamentos que causem sua morte. Sob determinadas circunstâncias, é legal na Suíça, por exemplo, mas a própria pessoa doente precisa se administrar os fármacos. Essa fórmula também é legal em alguns Estados norte-americanos, como o Oregon, onde o paciente – doente e depois da autorização e prescrição dos médicos – é quem se autoadministra as drogas.
Eutanásia. Etimologicamente, significa “boa morte” (do grego). Nela, cabe a um profissional de saúde administrar uma medicação que acabe com a vida de um paciente com uma doença terminal ou irreversível, que experimente um sofrimento não mitigável por outros meios, e que tenha feito o pedido de forma voluntária, expressa, clara, reiterada e informada. É legal na Holanda, Bélgica e Colômbia, por exemplo.
No Brasil, ambas as fórmulas são ilegais.