A Gazeta
Mato Grosso tem apenas 25,5% da quantidade de leitos necessários para atender a população atual. Segundo presidente do Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso (CRM/MT), Gabriel Felsky dos Anjos, o ideal seria ter 20 mil leitos disponíveis, já que a população ultrapassou a marca de 3 milhões de habitantes. Conforme dados do Ministério da Saúde, atualizados em agosto deste ano, o Estado conta atualmente com 5,1 mil leitos para atender toda a demanda do Sistema Único de Saúde (SUS). O total disponível está distribuído em 107 municípios, ou seja, há ainda em Mato Grosso 34 cidades que sequer contam com algum tipo de leito para atender a população. A saúde é um dos maiores desafios do governador eleito neste domingo.
De acordo com o presidente do CRM, o número de 20 mil leitos seria para atender a demanda estadual e ainda ter determinada quantidade em reserva. Ele explica que isto é necessário para caso Mato Grosso seja vítima de alguma epidemia, por exemplo. “O Estado também precisa contar com espaços disponíveis para momentos emergenciais. É uma precaução ter uma certa quantidade de leitos para resguardar a sociedade de uma epidemia ou casos mais graves. No atual cenário, se uma epidemia chegasse a ser registrada não haveria como atender este tipo de demanda”.
Gabriel dos Anjos também destaca a quantidade de denúncias que o Conselho recebe diariamente envolvendo a má qualidade do sistema público de saúde disponível na Capital e no Interior. Ele reforça que a atual estrutura das unidades não suporta a demanda e sequer o trabalho dos profissionais. Devido a isso, explica o profissional, há elevada presença de pacientes do Interior em Cuiabá e Várzea Grande. “É possível ver que não há interesse dos gestores em melhorar a saúde no Interior do Estado. É mais fácil colocar um paciente em uma ambulância e despachá-lo para a Capital, do que estruturar um local decente para atendimento. Além disso, há ainda o não desenvolvimento de políticas que despertem o interesse dos médicos em atuar no sistema público de saúde”.
O presidente do Conselho informa que a presença de leitos em todas as cidades de Mato Grosso é algo necessário. Ele confirma que esta situação evitaria a transferência em massa de pacientes para Cuiabá. “Não há uma legislação que obrigue todo e qualquer lugar ter leitos, pois se determinada quantidade destas unidades em um município suprir a demanda da vizinhança, isso já se faz necessário. Porém, em Mato Grosso, não é isso que acontece. A ausência destes leitos para receber as pessoas em suas próprias cidades acaba interferindo diretamente na superlotação do Pronto-Socorro da Capital, por exemplo”.
Na última quinta-feira (2), a reportagem do Jornal A Gazeta esteve no Pronto-Socorro de Cuiabá e registrou a presença de 113 pacientes do Interior aguardando atendimento médico. Este montante representava, na data, 47% do total de pacientes atendidos na unidade. A maioria esperava por cirurgia ortopédica. Levantamento recentemente realizado pela unidade revela que a fila para intervenção cirúrgica ortopédica já chega a 170 pacientes. Atualmente, estas cirurgias são realizadas tanto no Pronto-Socorro da Capital, como também no Hospital Metropolitano, em Várzea Grande.
<BF>Interior<XB> – Rosineide Costa do Nascimento, moradora do município de Peixoto de Azevedo, estava acompanhando o filho de 17 anos que havia sido baleado no pé no dia 1º de outubro. Devido a não disponibilidade de leitos na cidade, ele precisou ser deslocado 691 quilômetros para receber atendimento médico. O jovem, era um dos cerca de 60 pacientes que estavam nos corredores. Com o pé enfaixado, ele afirmou que voltava da escola, quando um grupo de pessoas começou atirar na região. Uma das balas acabou o atingindo em um dos pés. “Não tenho nenhum parente, nem conheço as pessoas em Cuiabá. Não tem sequer um lugar para que a gente possa tomar banho. Não vejo a hora desta situação acabar e podermos voltar para casa. Não imaginava que seria assim o Pronto-Socorro da Capital. Quando cheguei aqui, com meu filho, fiquei assustada”, afirmou Rosineide.
Outra história, também de Peixoto de Azevedo, é a do Jeandro Rodrigues de Souza. Com apenas 21 anos, ele aguarda uma cirurgia na região do fêmur. O rapaz se envolveu em um acidente de trânsito, ocorrido no dia 21 de setembro e desde o dia 23 do mesmo mês aguarda pela intervenção cirúrgica. A irmã de Jeandro, Sirlene Rodrigues de Souza, conta que a situação na unidade de saúde é complicada devido à grande quantidade de pacientes. “Os acompanhantes precisam dormir em cadeiras. A quantidade de leitos não é suficiente para atender todos. Muitas pessoas acabam ficando pelos corredores, como é o caso do meu irmão. Estamos na esperança de conseguir, o mais rápido possível, uma vaga para fazer esta cirurgia”.
Regina de Oliveira Souza, que é esposa do paciente Valdemar Marinho dos Santos, conta que a ausência de vagas para atender pacientes em Matupá é situação frequente. Ela conta que desde que o marido foi transferido para o Pronto-Socorro da Capital tem pago R$ 10 para tomar banho e se alimentado de fruta e um copo de suco. “Esta é a primeira vez que precisamos da unidade de saúde, mas confesso que não desejo essa situação nem para o meu pior inimigo. É desesperador estar aqui, ver essa quantidade de gente precisando de atendimento”, comenta a mulher que está na expectativa do esposo fazer uma cirurgia no fêmur.
Vítimas de um acidente envolvendo dois caminhões, os amigos Adriano Sehn e Paulo Antônio Saretto aguardam também por cirurgias ortopédicas. Os dois estão nos corredores do PS e na dependência dos parentes que fazem companhia. A transferência, de Campo Verde para a Capital, aconteceu pois na cidade não havia estrutura adequada para receber os casos. “Queremos que isso passe o mais rápido para que possamos ser atendidos em breve. Nos deram prazo de 30 dias para sermos operados. A realidade é triste quando se trata da saúde pública”, finalizou Adriano.