A Defensoria Pública de Mato Grosso propôs um habeas corpus coletivo no município de Barra do Bugres (168 km ao Médio-Norte de Cuiabá) para reverter a Portaria 001/2005, que proíbe que crianças e adolescentes permaneçam em vias públicas à noite. De acordo com o decreto, menores de 14 anos podem ficar até às 22h e, acima de 14, até às 23h.
O "toque de recolher" perde a validade apenas quando crianças e adolescentes estiverem acompanhados de pais, tutores ou guardiões. Além de englobar Barra do Bugres, a portaria vale para toda a comarca, que é composta pelos municípios de Porto Estrela, Denise, e Nova Olímpia e pelos distritos de Assari, Nova Fernandópolis e Currupira.
Segundo determinações do juízo da Comarca, a medida é uma forma de proteger os menores. Porém, conforme o defensor público Leandro Fabris Neto, o decreto vai totalmente de encontro com a Constituição Federal de 1988 e também o Estatuto da Criança e Adolescente (ECA).
"A intenção é boa, mas a gente não pode permitir que viole um ordenamento jurídico anterior. O Estado tem como obrigação buscar outros meios para evitar que crianças tenham, por exemplo, contato com álcool, drogas ou problemas na família", disse, em entrevista ao MidiaNews.
Conforme o defensor, o próprio Estatuto e também o Conselho Tutelar da Infância e Juventude prevêem proteção e, com o toque de recolher, os direitos constitucionais são "agredidos".
Na Carta Magna, por exemplo, o artigo 5º determina que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (…) e que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei…".
Já no artigo 16, da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, promulgada no Brasil por meio do Decreto 99.710/90, foi determinado que "nenhuma criança será objeto de interferências arbitrárias ou ilegais em sua vida particular, sua família, seu domicílio (…)".
Além disso, a atitude de privar crianças e adolescentes de sua liberdade, determinando o seu recolhimento forçado, configura crime nos moldes do artigo 230 do ECA, sob pena de seis meses a dois anos de detenção.
"O que acontece é que é que o Estatuto da Criança e Adolescente admite sim a edição de algumas normas, só que essa normalização não pode ter caráter geral e abstrato", pontuou o defensor.
Prazos
De acordo com o defensor público Leandro Fabris Neto, o procedimento para este tipo de habeas corpus é célere e já foi encaminhado para apreciação do Judiciário, que deu um prazo de cinco dias para que o juiz que editou a portaria apresente informações.
Após esta fase, a ação será encaminhada ao Ministério Público Estadual, que procede o parecer pelo cabimento ou não da ação, que por sua vez será levada a julgamento.