A diretoria colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) avaliará nesta sexta-feira, 4, em reunião extraordinária às 14h, os pedidos de importação das vacinas contra covid-19 Sputnik V e Covaxin.
Em março, a agência rejeitou a solicitação do Ministério da Saúde para autorização excepcional e temporária para importação e distribuição da vacina indicana Covaxin/BBV152. Na época, a direção da Anvisa informou que os dados apresentados não cumpriram os requisitos de lei para atestar a qualidade e eficácia da vacina indiana. O Ministério da Saúde tem contrato para compra do imunizante, produzido pela Bharat Biotech, da Índia.
No início do mês de maio, a Anvisa autorizou a realização de estudos clínicos no Brasil da vacina indiana Covaxin pela empresa brasileira Precisa Farmacêutica. O estudo de fase 3 – a última antes da autorização para uso – será realizado em 4.500 voluntários no Brasil, nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Mato Grosso, e prevê a aplicação de duas doses, com 28 dias de intervalo.
Já o imunizante russo Sputnik V teve a importação negada em abril pela Anvisa por falta de dados básicos para análise do produto e em falhas identificadas pela área técnica da agência que podem comprometer eficácia, segurança e qualidade do imunizante.
Segundo a legislação, Estados, municípios e o Distrito Federal ficam autorizados a adquirir, a distribuir e a aplicar as vacinas contra a covid-19 registradas, autorizadas para uso emergencial ou autorizadas excepcionalmente para importação caso a União não realize as aquisições e a distribuição tempestiva de doses suficientes para a vacinação dos grupos previstos no Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação.
Histórico da Sputnik V
A pressão sobre a Anvisa para uma autorização para importação excepcional da Sputnik se apoiou na lei 14.124/2021. A norma prevê que Estados e municípios podem importar e utilizar vacinas em caráter excepcional contanto que o imunizante tenha recebido aprovação dos órgãos regulatórios de um dos seguintes países/regiões: EUA, União Europeia, Japão, China, Reino Unido, Rússia, Índia, Coreia, Canadá, Austrália e Argentina. Pela norma, a Anvisa tem 30 dias para se posicionar sobre a importação. Caso não o faça, a autorização é automática.
A partir de um pedido do governo do Maranhão para importação de doses, o ministro Ricardo Lewandowski, do STF, confirmou esse prazo de 30 dias, que venceria no final de abril. A Anvisa chegou a entrar com recurso dia 20 de abril, pedindo a suspensão do prazo sob a alegação de que faltam dados que atestem a segurança e eficácia do imunizante, mas Lewandovski negou o pedido. Na avaliação do ministro, não cabia prorrogação, uma vez que a lei em questão foi desenhada justamente para acelerar os procedimentos de aprovação das vacinas no contexto da “gravíssima” pandemia.
A pressão sobre a Anvisa pela aprovação do imunizante foi intensa também por parte do Congresso. Em fevereiro, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), afirmou ao Estadão que iria “enquadrar” a Anvisa, numa declaração que foi entendida por integrantes da agência como pressão política no órgão técnico.
No mesmo dia, o Congresso chegou a aprovar projeto de lei para que a agência autorizasse, em cinco dias, o uso emergencial de vacinas já aprovadas em outros países, como Rússia e Argentina. O trecho que estabelecia o prazo foi vetado pelo presidente Jair Bolsonaro.
O lobby no Congresso teve como um dos líderes o ex-deputado federal Rogério Rosso, ex-líder do Centrão na Câmara que se tornou em 2019 diretor de negócios da farmacêutica União Química, parceira do governo russo na produção do imunizante no Brasil.
Apesar da pressão, a Sputnik vem despertando desconfiança e insegurança em outras agências regulatórias. Nesta segunda-feira, a chanceler da Alemanha, Angela Merkel, declarou que a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) ainda não recebeu dados suficientes dos estudos da vacina que permitam uma aprovação do produto no continente.
DOSES DA SPUTNIK NEGOCIADAS NO PAÍS
Ministério da Saúde – 10 milhões
Consórcio Nordeste – 37 milhões
Consórcio Brasil Central (GO, MS, MT, DF, TO, MA E RO) – 28 milhões
Niterói (RJ) – 800 mil
Maricá (RJ) – 500 mil
TOTAL: 76,3 milhões
Histórico da Covaxin
O governo federal comprou 20 milhões de doses da Covaxin, por cerca de US$ 14 cada unidade. No total, o negócio é de R$ 1,6 bilhão, mas o pagamento só será feito após a Anvisa liberar o uso do produto, segundo a Saúde. Trata-se de valor superior ao de cada dose da vacina de Oxford/AstraZeneca, fabricada na Índia (US$ 5,25 por unidade), e os US$ 10 pagos pela Coronavac.
A expectativa do ministério era de que 8 milhões de unidades desembarcassem no País ainda em março. No mês seguinte, o mesmo volume. Em maio, outras 4 milhões de doses. Na época, a Anvisa afirmou que os lotes já feitos desta vacina poderiam estar comprometidos, pois “não teriam a garantia de reprodutibilidade com os lotes clínicos e da segurança do produto”.
Líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-PR) disse ao Estadão, no começo de fevereiro, que iria “enquadrar” a Anvisa para forçar a liberação de vacinas ao País. Além da retórica, o deputado apresentou emenda à Medida Provisória 1.026/2021 para que a Anvisa liberasse imunizantes aprovados na Índia, ação que facilitava a entrada da Covaxin.