Welington Sabino, repórter do GD
![]() Walter Dias Magalhães segue preso por não ter levantado R$ 6,1 milhões para pagar a fiança |
Embora tenha declarado em interrogatório ser dono de um patrimônio de R$ 32 milhões, o golpista Walter Dias Magalhães Júnior, que se apresenta como empresário e foi preso na Operação Castelo de Areia em agosto de 2016, ainda não conseguiu pagar a fiança de R$ 6,1 milhões imposta pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) em novembro. Na tentativa de substituir a fiança por uma fazenda em nome de outra pessoa ele se complica cada vez mais. A operação também levou para a cadeia o vereador cassado, João Emanuel Moreira Lima.
A Fazenda Santa Fé, localizada em Jaciara (144 Km ao sul de Cuiabá) que Walter ofereceu como garantia de fiança, está em nome de outra pessoa e possui uma série de irregularidades envolvendo, inclusive, o registro em 2 cartórios diferentes. Em resumo, os autos apontam que são fortes os indícios de fraude também envolvendo a documentação do imóvel.
Por este motivo a juíza Selma Rosane Santos Arruda, titular da 7ª Vara Criminal de Cuiabá, marcou para o dia 24 de março, às 16h30, uma audiência para ouvir o dono do imóvel, Denisson Seabra. Enquanto isso, o estelionatário Walter Dias segue preso no Centro de Ressocialização de Cuiabá (CRC).
Dentre as irregularidades envolvendo a propriedade rural com mil hectares, a magistrada destaca que existem 2 registros do imóvel. Inicialmente, documentos anexados ao processo apontavam que a fazenda estava registrada no Cartório do 5º Serviço Notarial e de Registro de Imóveis da 2ª Circunscrição Imobiliária da Comarca de Cuiabá. Agora, novos documentos foram apresentados indicando que a mesma área de terra também está registrada sob a matrícula número. 20.086, no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Jaciara.
![]() Jusíza Selma Rosane vai ouvir dono de fazenda diante de indícios de fraude na documentação |
“Se não bastasse isso, em análise minuciosa dos autos, vê-se que os novos documentos trazidos pela defesa em vez de aclararem a situação do imóvel, na verdade a tornaram ainda mais nebulosa, com sérios indícios de ocorrência de fraude”, afirma a juíza Selma Rosane em seu despacho proferido na última quinta-feira (23).
A magistrada, diante dos indídios de fraude e irregularidades no imóvel e levando-se em conta que o réu tenta ofertar a fazenda para substituir uma fiança milionária e deixar a cadeia, ela deferiu o pedido do Ministério Público para realização de digilências no caso.
Assim, o imóvel ofertado em hipoteca passará por uma avaliação a ser realizada por meio de servidor habilitado devendo esclarecer a localização precisa do terreno ofertado, bem como se existe nele alguma edificação (sede, barracões, etc) e se a área encontra-se arrendada, cedida ou ocupada. O avaliador deverá produzir relatório informadon em detalhes todas as diligências realizadas. O Ministério Público e a defesa de Walter Magalhães serão intimados sobre a nova decisão.
Entenda – Apontado pela Polícia Civil como um dos maiores golpistas de Mato Grosso, Walter Dias é acusado de chefiar uma organização criminosa que aplicava golpes milionários contra várias vítimas em Mato Grosso e outras partes do Brasil usando a empresa Soy Group Holding América Ltda, a qual o vereador cassado, João Emanuel Moreira Lima também tinha ligação se identificando como vice-presidente.
Na operação deflagrada no dia 26 de agosto de 2016 pela Gerência de Combate ao Crime Organizado (GCCO), da Polícia Civil foram investigados crimes de estelionatos praticados pela organização criminosa que era chefiada por Walter e agia em todo o estado de Mato Grosso aplicando variadas formas de golpes. Segundo as investigações, os membros da quadrilha deixam prejuízos que ultrapassaram R$ 50 milhões para um dos golpes.
Leia a íntegra da decisão
Decisão->Determinação
VISTOS ETC.
Nos termos do Art. 330, do CPP, a fiança, que será sempre definitiva, consistirá em depósito de dinheiro, pedras, objetos ou metais preciosos, títulos da dívida pública, federal, estadual ou municipal, ou em hipoteca inscrita em primeiro lugar.
O parágrafo 1o do referido artigo dispõe, ainda que “a avaliação de imóvel, ou de pedras, objetos ou metais preciosos será feita imediatamente por perito nomeado pela autoridade.”
Assim, claro está no Código de Processo Penal que, em se tratando de hipoteca de imóvel para a fiança, o bem oferecido deve ser previamente avaliado, para saber se o seu valor é equivalente ao valor da fiança arbitrada.
Ademais, após a avaliação, sendo o valor suficiente, o Juízo determina a inscrição da hipoteca em primeiro lugar para, depois de inscrita, expedir o alvará de soltura ao acusado.
Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, que, ainda que em caráter liminar (provisório), assim já vem decidindo:
“(…)
03. À vista do exposto, defiro, parcialmente, a tutela de urgência reclamada. Mantidas as demais medidas cautelares especificadas na decisão datada de 18/05/2015, deverá ser expedido alvará de soltura tão logo seja perfectibilizada a fiança mediante hipoteca do imóvel matriculado sob o n. 147.459 do Cartório do 9º Ofício de Registro de Imóveis do Rio de Janeiro/RJ. Publique-se. Intimem-se.” (HC 324500-PR {2015/0118603-8} – Relator Ministro Convocado Newton Trisotto – decisão liminar no dia 21/05/2015 – DJe: 27/05/2015) GRIFEI
Veja que somente com o registro da hipoteca é que resta perfectibilizada a fiança, possibilitando, assim, a expedição do Alvará de Soltura.
Ocorre que, no presente caso, o bem ofertado pelo acusado WALTER DIAS MAGALHÃES JÚNIOR não é de sua propriedade e sim de um terceiro totalmente alheio ao processo, situação que, conforme já decidiu o TRF-4 (HABEAS CORPUS Nº 5015121-09.2015.404.0000/PR), não impede que o imóvel seja ofertado em hipoteca.
Contudo, o Juízo deve analisar o caso com cautela. Trata-se de apuração de fatos graves, vários crimes de estelionato praticados, segundo a denúncia e em Juízo de cognição sumária, por uma organização criminosa especializada em tal mister, da qual o acusado seria um dos líderes.
A fiança foi arbitrada pelo E.TJMT em cifras milionárias, no valor de R$ 6.160.000,00 (seis milhões, cento e sessenta mil reais) e, desde que oferecido o imóvel em hipoteca, uma série de irregularidades sobre o mesmo foram detectadas pelo Juízo, conforme restou consignado nas decisões de fls. 1087 e 1092/1093vº, das quais foram comunicados o Relator do HC nº. 145777/2016, a Corregedoria-Geral da Justiça e a Diretoria do Fórum da Comarca de Várzea Grande/MT.
Ademais, é de se frisar que, conforme consta no acórdão do HC nº. 145777/2016, a fiança no valor de R$ 6.160.000,00 (seis milhões, cento e sessenta mil reais), “…não chega a vinte por cento do patrimônio declarado pelo paciente em seu interrogatório extrajudicial, que foi de R$ 32.000.000,00 (trinta e dois milhões de reais).” Cópia do referido interrogatório encontra-se juntada às fls. 444/448.
Contudo, mesmo tendo patrimônio mais do que suficiente para a garantia do pagamento da fiança, ofereceu em hipoteca imóvel de terceiro, cujo proprietário é DENISSON SEABRA (fls. 996/997vº).
Oportuno consignar que, diante de todas essas constatações, não há como se aplicar a este caso o precedente existente no HC nº. 143911/2016, já que lá, além do valor arbitrado a título de fiança ser 10 (dez) vezes menor que o estipulado ao acusado WALTER, o bem ofertado era de propriedade pessoal do Paciente/acusado.
Outrossim, conforme consignado na decisão de fls. 1139, a defesa levou mais de 45 (quarenta e cinco) dias para trazer a Juízo novos documentos sobre o bem oferecido em hipoteca, de forma que não pode ser atribuída ao Juízo qualquer desídia na análise do feito.
Se não bastasse isso, em análise minuciosa dos autos, vê-se que os novos documentos trazidos pela defesa em vez de aclararem a situação do imóvel, na verdade a tornaram ainda mais nebulosa, com sérios indícios de ocorrência de fraude.
Veja que no primeiro momento em que o imóvel foi oferecido em hipoteca, a defesa fez juntar cópia da matrícula nº. 49.900, do 5º Serviço Notarial e Registro de Imóveis da 2ª Circunscrição Imobiliária desta Comarca, com certidão de que o imóvel “…não se encontra gravado por hipoteca legal ou convencional nem por qualquer ônus real, e não responde por encargos decorrentes de tutela, curatela ou testamentária, nem por ações reais pessoais e reipersecutórias, nem por cédula rural hipotecária ou pignoratícia, não existindo protesto contra alienação de bens.” (fls. 996/997vº).
Ou seja, referida matrícula encontra-se ativa e, a princípio, apta para ser gravada com a hipoteca oferecida.
Ocorre que com a juntada dos novos documentos, foi possível verificar que a mesma área de terra também está registrada sob a matrícula nº. 20.086, no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Jaciara, havendo informação de que se tratava da transferência da matrícula registrada nesta Comarca, o que não condiz com a realidade, conforme acima relatado (fls. 1143).
Cabe consignar, ainda, que no Certificado de Cadastro de Imóvel – CCIR, juntado às fls. 1145, é mencionado que o imóvel é registrado no Cartório de Registro de Imóveis desta Comarca e não em Jaciara/MT, o que reforça a constatação de que as duas matrículas encontram-se ativas.
Havendo duas matrículas, o proprietário da área poderia muito bem oferecer uma delas em hipoteca a este Juízo, enquanto dispunha livremente da outra, da forma com bem pretendesse, podendo, inclusive, alienar o imóvel, fazendo com a fiança restasse quebrada.
Assim, diante da gravidade dos fatos, do significativo valor arbitrado a título de fiança, bem como diante das várias irregularidades anteriormente e agora constatadas pelo Juízo, tenho que o deferimento de parte das diligências pretendidas pelo Ministério Público às fls. 1140/1141 é medida salutar.
Desta forma, determino seja expedida carta precatória à Comarca de Jaciara/MT, a fim de que seja procedida a avaliação da área ofertada em hipoteca, por meio de Servidor habilitado para tanto. Juntamente com a missiva, encaminhem-se cópias das matrículas juntadas às fls. 997/vº e 1143.
Na avaliação deverá constar, ainda, a localização precisa da área ofertada, bem como se existe nela alguma edificação (sede, barracões, etc) e se a área encontra-se arrendada, cedida ou ocupada, informando o Avaliador, pormenorizadamente, as diligências realizadas.
Consigne-se o prazo de 10 (dez) dias para cumprimento da missiva.
Outrossim, entendo necessária a oitiva do proprietário da área, Sr. DENISSON SEABRA, a fim de esclarecer os pontos mencionados pelo Ministério Público na manifestação de fls. 1075/1077, dentre outros.
Para tanto, designo audiência para o dia 24/03/2017, às 16:30 horas.
Intime-se o Sr. Denisson Seabra, observando os endereços constantes na referida manifestação (fls. 1077), bem como nas “Escrituras Públicas de Declaração de Vontade” de fls. 1129/vº e 1131/1132.
Intime-se o Ministério Público e a defesa do acusado WALTER DIAS MAGALHÃES JÚNIOR.
Cumpra-se.
Cuiabá, 23 de fevereiro de 2017.
SELMA ROSANE SANTOS ARRUDA
JUÍZA DE DIREITO